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Publicado em maio – junho de 2017 - ano 58 - número 315

Nossa Senhora Aparecida e o nacionalismo

Por José Cordeiro

A consagração da imagem como padroeira do Brasil recuperou o protagonismo da Igreja diante do governo e da população católica e estabeleceu um projeto comum: a integração do país.

 Introdução

Nas gravuras da milagrosa Virgem de Aparecida estão as formas mais populares da iconografia da imagem e de sua influência sobre os fiéis católicos. Nossa Senhora Aparecida já foi representada sobre nuvens e com as mais variadas configurações de anjos; sobre os pescadores no rio Paraíba; sobre a Matriz Basílica; sobre o globo terrestre e em combinações sobre bandeiras, brasões dos estados e do Brasil.

As tradicionais impressões e quadros revelam ações da Virgem Maria diante das aflições do povo, como provedora de saúde e justiça. E, nos períodos mais conturbados da história brasileira, o apelo popular por paz e união no país.

É a partir de um conjunto de reproduções temáticas da imagem, com divulgação iniciada na década de 1930, que reconhecemos a importância de Nossa Senhora Aparecida na conciliação da política nacional em períodos marcados por levantes militares, golpes de Estado, ditaduras, guerras mundiais e o temor de ações ideológicas, anticlericais e de controle da Igreja, a exemplo de episódios ocorridos na União Soviética, no México e na Espanha.

Desde a proclamação da República, em 1889, a Igreja brasileira tentava reorganizar-se e, diante da escassez de sacerdotes, superar as dificuldades impostas pela monarquia e pelo padroado régio, que manteve décadas de controle sobre as ordens, sobre a formação de seminaristas e, em meados do século XIX, impediu a entrada de religiosos brasileiros que professassem no exterior.

Nos primeiros anos do regime republicano, coube ao clero lidar com profundas alterações estruturais do país, como a entrada de milhares de estrangeiros em lavouras e cidades, a degradação da saúde pública e a multiplicação dos problemas sociais decorrentes da marginalização da população mais pobre e da exploração do incipiente trabalho operário.

Recuperava a Igreja o protagonismo diante do governo e da população católica; nas décadas de 1910 e 1930, passaram pelos sacerdotes e associações de leigos iniciativas sociais de combate à epidemia de gripe espanhola e a pacificação regional diante de levantes militares.

Em 1918, no município de São Paulo, voluntários e entidades religiosas atenderam 85.492 pessoas e hospitalizaram 1.700 enfermos. Foi às igrejas que, no Levante Tenentista de 1924, os paulistanos acorreram em busca de alimentos e segurança diante do cerco promovido pelas forças legalistas aos rebeldes.

O bombardeio contínuo da artilharia federal sobre o movimento revoltoso provocou mortes, destruição na cidade e estragos na matriz do Cambuci, nas igrejas de Santa Ifigênia, de Santo Antônio do Pari, de São José do Belém, de São Januário da Mooca, de Santo Agostinho e de Santa Generosa.

Numa carta pastoral sobre o momento político, dom Duarte Leopoldo e Silva, arcebispo de São Paulo, conclamou o apaziguamento e a tranquilidade social, determinando: “na Basílica de Nossa Aparecida será rezada, todos os sábados, enquanto não mandarmos o contrário, uma Missa em louvor de Nossa Senhora pela pacificação do Brasil e uma expiação dos nossos pecados políticos e sociais”.

  1. Unidade nacional

Era em torno da nação que os organizadores do II Congresso Mariano, realizado em setembro de 1929, sugeriam a proclamação de Nossa Senhora Aparecida para o padroado, com o lema “União indissolúvel entre Religião e Pátria. Nossa Senhora Aparecida e Brasil – Unidade Nacional”.

Marco do jubileu de 25 anos de coroação da imagem de Aparecida, o congresso foi convocado para exaltar os “conhecimentos de Maria santíssima” e tornar Nossa Senhora Aparecida a padroeira principal do país. A consagração como padroeira significava o reconhecimento e a adesão das forças políticas ao papel reservado pela Igreja às tradições familiares, bem como a um projeto comum, a integração do país.

Bispos e arcebispos presentes ao Congresso Mariano assinaram uma solicitação que foi encaminhada a Roma. O documento oficial, encabeçado pelo arcebispo coadjutor do Rio de Janeiro, dom Sebastião Leme, reivindicava a concessão do título de padroeira do Brasil a Nossa Senhora Aparecida. O padroado representaria a aspiração popular de devotos de diversos lugares do país.

 Sobre a escolha da imagem de Nossa Senhora Aparecida pendia a necessidade da unidade católica nacional, ampliada pelo caráter mariano do santuário de Aparecida, pela origem popular da santa, surgida nas mãos de pescadores, e, finalmente, pela cor negra da imagem, que simbolizaria as camadas populares mais discriminadas.

 Em 1o de setembro de 1930, a Nunciatura Apostólica do Rio de Janeiro comunicava ao arcebispo de São Paulo, dom Duarte, a esperada concessão dada pelo papa Pio XI. O decreto fora assinado em 16 de julho de 1930 pelo então secretário de Estado, o cardeal Eugênio Pacelli, mais tarde eleito papa com o nome de Pio XII.

 Além da estagnação gerada na economia brasileira pela queda nas exportações decorrentes da crise de 1929, no plano político, o país ressentia-se da controversa sucessão eleitoral à presidência da República que, em 1930, consolidou no grupo derrotado a ideia de um golpe militar para depor o presidente Washington Luís e impedir a posse de Júlio Prestes. O candidato Getúlio Vargas liderou a articulação política e o movimento armado que culminou, no fim de outubro, com a criação da junta provisória, que lhe confiou o poder.

  1. A imagem na esplanada do castelo

Com o equilíbrio da situação política no país, o cardeal Leme submeteu a dom Duarte a ideia de uma grande cerimônia que iria consagrar, em 1931, a imagem de Nossa Senhora Aparecida na capital federal. Para o cardeal, “além de todos os motivos de fé e gratidão, o patriotismo exige de nós, ao menos aqui no Rio, uma grande afirmação de fé”. Dom Sebastião Leme referia-se também ao momento “trágico” que o país atravessava e à existência do movimento comunista.

 Era apresentado um extenso programa de atividades no Rio de Janeiro, uma quinzena de festas em louvor a Nossa Senhora Aparecida, “sendo oito dias, de 17 a 24, de festas paroquiais e oito, de 24 de maio a 31 de maio, de festas diocesanas. No dia 31 de maio, haverá uma procissão triunfal”, descrevia a programação oficial.

A imagem seguiu de Aparecida para o Rio de Janeiro pelas mãos do arcebispo de São Paulo, dom Duarte. Num trem especial, um carro foi transformado em capela para a santa. O embarque aconteceu na noite do sábado, 30 de maio, depois da realização do ofício de Nossa Senhora Aparecida.

O povo compareceu às cerimônias no Rio de Janeiro. Na manhã do dia 31, o cardeal Leme, representantes do clero e numerosos fiéis recepcionaram a imagem na estação D. Pedro II e a levaram em carreata até a igreja de São Francisco de Paula, para missa campal. Em seguida, o cortejo prosseguiu para a catedral Metropolitana. Organizava-se ali, com saída às 14 horas, uma procissão com crianças, integrantes das ligas católicas, as Filhas de Maria e as congregações marianas, entre outras associações. Ao centro, a imagem de Nossa Senhora Aparecida no carro-andor e a Guarda de Honra. A hierarquia católica, além de religiosos, personalidades públicas e militares, fechava as fileiras.

 Na esplanada do castelo, o chefe do governo provisório, Getúlio Vargas, chegou pouco depois do início da tarde. Vargas foi recebido pelo ministro Osvaldo Aranha e pelo núncio apostólico, dom Aloísio Masella, e permaneceu num tablado especial, junto ao corpo diplomático, aos políticos e aos demais representantes da sociedade. Com a aproximação do cortejo, Vargas foi convidado para o centro da celebração.

 Pelas mãos de dom Duarte, a imagem foi conduzida ao altar e beijada por dom Sebastião Leme. Getúlio Vargas aproximou-se e repetiu o gesto, beijando os pés de Nossa Senhora Aparecida. O cardeal Leme proferiu a consagração solene e depois o discurso, em que exaltava o caráter simbólico da cerimônia, embora o conteúdo fosse entremeado pelo nacionalismo: “Virgem da Conceição Aparecida, salvai o nosso Brasil, guardai as nossas famílias, livrai-nos dos tremendos abismos que satã quer abrir aos nossos pés”.

 A partir da proclamação do padroado, foram acrescentados e difundidos, para os fiéis, novos elementos na iconografia da imagem. E a estampa tradicional com Nossa Senhora Aparecida passou a ser reproduzida sobre a baía de Guanabara e vistas das cerimônias no Rio de Janeiro, ressaltando a presença mariana sobre o país.

 A despeito do engajamento popular numa solução pacífica para a retomada das eleições presidenciais, crescia o descontentamento com os plenos poderes de Getúlio Vargas, cujas medidas autoritárias dificultavam a vida, a política e a autonomia locais. Para os paulistas, criava-se assim o ambiente de rebelião pró-constituição.

 Em 9 de julho de 1932, o movimento constitucionalista ganhou o apoio da força pública, dos militares aquartelados e de 10 mil voluntários, alistados na capital e no interior. A Cúria metropolitana organizou o serviço de capelania para as tropas e o voluntariado nos serviços de emergência. Os religiosos e leigos de Aparecida atuaram na organização constitucionalista, uma vez que o município era um ponto importante na frente norte dos combatentes, recebendo os trens com as tropas que iam defender as posições na divisa do estado.

 A cidade formou o batalhão Padroeira do Brasil, que seguiu, no dia 18 de agosto, com 53 voluntários, para São Paulo. A corporação tinha como símbolo uma bandeira do Brasil, ornamentada na esfera azul com a imagem de Nossa Senhora Aparecida, que, por sua vez, trazia um manto branco.

 A imagem padroeira foi homenageada pelos combatentes paulistas em 4 de setembro. O Estado-Maior do exército constitucionalista resolveu homenagear a “gloriosa padroeira do Brasil”, nomeando como “Linha Nossa Senhora Aparecida” toda a frente de combate no Vale do Paraíba.

 Em relação às tropas de Vargas, os constitucionalistas enfrentavam graves limitações, como a falta de soldados experientes e a reposição de armamentos. Ainda que os constitucionalistas contassem com expressivo número de voluntários, as forças federais possuíam, no fim do conflito, efetivo de 100 mil homens, contra aproximadamente 40 mil do outro lado.

 Pouco a pouco, caíam as linhas de cobertura e as tropas paulistas retraíam-se para outros pontos da retaguarda, até que, em 19 de setembro, o quartel-general constitucionalista passou a funcionar próximo à estação ferroviária de Aparecida. Diferentemente das evoluções festivas para a padroeira do Brasil, realizadas na capital federal no ano anterior, os aviões militares voltariam a sobrevoar os fiéis de Nossa Senhora Aparecida, desferindo ataques aéreos à cidade, em 26 e 28 de setembro. O armistício seria celebrado em 2 de outubro de 1932. O conflito durou três meses e deixou mais de 600 mortos e aproximadamente 15 mil feridos.

  1. Manifestações sociais

Além da cristianização da legislação – como a educação religiosa no período escolar, a proibição do divórcio e o reconhecimento do casamento religioso –, a grande preocupação de parte do clero brasileiro nos anos 1930 foi o combate ao comunismo, sobretudo pelos exemplos de perseguições à Igreja Católica em vários países europeus.

Não que o tema fosse algo novo, pois já era tratado, desde 1891, com a publicação da Carta Encíclica Rerum Novarum de Leão XIII sobre a condição dos operários, os direitos, os deveres, o capital, o trabalho e a forma violenta empregada na solução desses conflitos. Em 1931, o papa Pio XI, na Carta Encíclica Quadragesimo Anno, denunciaria também o socialismo e, em 1937, o autoritarismo nas cartas Mit Brennender Sorge e Divini Redemptoris.

 A fonte local de preocupações, o Partido Comunista do Brasil (PCB), fundado em 1922, oscilava entre a ilegalidade e o amparo da legislação. Em novembro de 1935, militares aliados da causa comunista deflagrariam um movimento armado nos quartéis do Rio Grande do Norte, de Pernambuco e do Rio de Janeiro. O levante seria rapidamente sufocado pelas forças leais ao governo. O líder comunista Luís Carlos Prestes foi preso em 1936.

 Sob o impacto da situação política e das manifestações sociais, a capital federal foi sede da Concentração Nacional das Congregações Marianas, entre 1o e 3 de maio de 1937. Uma réplica da imagem padroeira foi levada de Aparecida para o evento.

 Uma missa campal foi celebrada pelo núncio apostólico no espaço denominado Feira de Amostras. Os congregados marianos desfilaram pela avenida Rio Branco até o largo São Francisco de Paula, em uma demonstração pública que pedia a paz e a proteção da imagem de Nossa Senhora Aparecida.

  1. As representaçõesda padroeira do Brasil

 É do século XIX, exatamente de 1854, a primeira estampa produzida com a imagem de Nossa Senhora Aparecida. Foi impressa a pedido de dom Antônio Joaquim de Melo, bispo de São Paulo, em comemoração à publicação, pelo Vaticano, do dogma da Imaculada Conceição.

 Aparece em duas versões, uma em preto e branco e a outra colorida, esta impressa em Paris. Curiosamente, essas estampas apresentam o padrão europeu da imagem de Nossa da Conceição, com rosto e mãos brancas.

 Com o avanço dos meios gráficos para reprodução de fotografias, surgem os quadros conhecidos como “verdadeiro retrato de Nossa Senhora Aparecida”, nos quais era possível verificar a tonalidade enegrecida e formas da escultura sacra. Geralmente, a representação incluía elementos dos principais milagres e vistas do santuário.

 Anos depois, uma fotografia com detalhes mais apurados seria utilizada nas publicações da Igreja e em muitas impressões encontradas no comércio. É possível acompanhar, na revista editada pelo santuário de Aparecida, um processo de adaptação da imagem padroeira em novos cenários, de acordo com as preocupações sociais que envolviam o país.

 Lançado em 1927, o Almanak de N. Senhora Apparecida (com título atualizado para Almanaque da Basílica Nacional de N. Senhora Aparecida, em 1934; para Ecos Marianos da Basílica Nacional de N. Senhora Aparecida, em 1936) apresentou, na capa inaugural, a imagem de Nossa Senhora sobre a basílica e parte do centro urbano do ainda distrito de Guaratinguetá.

O padrão de composição – a imagem santa sobre a igreja, sobre o rio Paraíba do Sul ou sobre o globo terrestre – passou a receber os elementos patrióticos, como os brasões dos estados. Juntava-se o manto, que é o sinal da consagração religiosa à unidade cívica. Na década de 1950, surgem os símbolos nacionais como a bandeira, o brasão do estado de São Paulo ou a bandeira do Brasil e a bandeira do Vaticano, mesclados aos históricos bordados.

  1. A Igreja e Getúlio Vargas

 Com apoio militar, alegando que a sucessão presidencial tendia a resolver-se com violência e na contingência de uma guerra civil, Getúlio Vargas dissolveu o Congresso e manteve-se no poder com um golpe de Estado. Tinha o apoio dos governadores, que se tornaram interventores estaduais. Prorrogou seu mandato por seis anos, de acordo com uma nova Constituição que ele próprio outorgara. Era o Estado Novo, instaurado em 10 de novembro de 1937.

 A Carta Constitucional da ditadura de Vargas, em seu artigo 2o, estabeleceu o uso obrigatório da bandeira nacional e aboliu hinos e armas regionais. A tradicional capa da Ecos Marianos com Nossa Senhora Aparecida ladeada pelos brasões estaduais, que circulou a partir de 1935, precisou ser substituída. Como a edição da Ecos Marianos de 1938 contrariava a lei de Vargas, a solução foi explicar que aquele número havia sido produzido com considerável antecedência.

  1. Noite de Nossa Senhora

Foi para a concentração popular Noite de Nossa Senhora, em 1945, que a imagem original da santa saiu oficialmente, pela segunda vez, do santuário de Aparecida.

 Dessa forma, foi aberta outra exceção em relação à imagem de Aparecida. Em sessão plenária do cabido metropolitano, em 1931, em que dom Duarte atendeu ao pedido para a visita e para a festa da padroeira na capital federal, ele esclareceu, em carta a dom Leme, que aquela concessão se tratava de um privilégio e que não se poderia “invocar o precedente nem mesmo para a sede da arquidiocese”.

 Nossa Senhora Aparecida presidiu na catedral da Sé, em 14 de julho de 1945, uma vigília, convocada – conforme anúncio nos jornais – como “A Estrela do Brasil para Salvar o Brasil – espetáculo cívico religioso”. Segundo a capa de O Estado de S. Paulo, “a verdadeira e excelsa padroeira do Brasil pela primeira vez virá a esta capital presidir a grandiosa manifestação dos católicos ao Episcopado Nacional e à Força Expedicionária Brasileira. Além dos acontecimentos de ordem social, tendo em vista as graves responsabilidades”.

 O jornal referia-se ao ambiente político que precedia à realização de eleições, convocadas depois de muita pressão nacional e internacional sobre Getúlio Vargas. A vigília antecipava-se à outra manifestação popular no mesmo dia, dessa vez no Estádio do Pacaembu e anunciada como “São Paulo e Luís Carlos Prestes”, em torno do líder comunista recém-anistiado e postulante a um cargo eletivo.

 A catedral foi aberta para a vigília e visitação à imagem durante toda a madrugada. Na manhã do domingo, foram realizadas missas. O arcebispo metropolitano fez a celebração solene para fiéis e organizações de operários, como Marcha Operária do Belém, Federação dos Círculos Operários e Federação das Ligas Católicas.

  1. O Jubileu dos 250 anos

 Como parte dos festejos do 250o aniversário do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida no rio Paraíba do Sul, que seria comemorado em 1967, os membros do Conselho Nacional Pró-Santuário de Nossa Senhora Aparecida decidiram organizar uma peregrinação da imagem padroeira pelo Brasil, plano que corresponderia aos anseios do povo brasileiro.

 O presidente do Conselho e arcebispo coadjutor de Aparecida, dom Antônio Ferreira de Macedo, informaria, em 22 de abril de 1965, em carta-circular ao Episcopado Nacional, a importância e o alcance das celebrações que teriam a “imagem milagrosa (não fac-símile)” em várias regiões do território: “Será a visita da padroeira ao Brasil. Durante o Ano Jubilar, virá o povo pagar a visita com peregrinações representando as diversas regiões. Será então a visita do Brasil à sua padroeira.”

 Dom Macedo esclareceu também que a resolução havia sido precedida de um coincidente pedido, oriundo de Minas Gerais e subscrito por autoridades, “entre as quais o Exmo. Sr. Presidente da República, Marechal Humberto de Alencar Castello Branco, o Sr. Vice-Presidente da República, Dr. José Maria Alkmin, o Sr. Governador de Minas Gerais, Dr. José de Magalhães Pinto, o Ministro da Guerra, General Arthur de Costa e Silva, o Comandante da Força Pública Mineira, Cel. José Geraldo de Oliveira, e muitas outras personalidades ilustres”.

 A solicitação de Minas Gerais foi entregue por uma comitiva ao cardeal Motta, em Aparecida. Dizia o texto: “O Povo Mineiro, interpretando o desejo de todo o povo brasileiro, vem pela comissão abaixo relacionada, respeitosamente, pedir a Vossa Eminência Reverendíssima e ao DD. Conselho Administrativo da Basílica de Nossa Senhora Aparecida que se dignem conceder licença para que a Imagem de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, seja levada em triunfante peregrinação às capitais de todos os estados do Brasil, sendo em Brasília aclamada Generalíssima das Gloriosas Forças Armadas Brasileiras”.

 Seriam realizadas oito peregrinações entre 1965 e 1967. Como preparação para as celebrações do Jubileu do Encontro da Imagem, foram “visitadas 21 arquidioceses, 64 dioceses, 8 prelazias, num total de 93 circunscrições eclesiásticas. As cidades visitadas foram 885. E, em 321 dias de peregrinação, a imagem percorreu 45.400 quilômetros, dos quais 15.515 por via aérea e 100 por via fluvial”, de acordo com a estatística e os trajetos publicados pela revista Ecos Marianos. Em 1968, a imagem faria outras sete peregrinações menores e regionais.

Nos anos seguintes, o Brasil percorreria um longo e difícil caminho até reconciliar-se com a democracia e a liberdade social. Da repressão do regime militar às recentes manifestações populares pela ética e contra a corrupção, o país retomou um projeto que, se não unânime, mostra-se amplo e definitivo com relação à cidadania.

Conclusão: O jubileu dos 300 anos

Cinco décadas separam as datas jubilares em homenagem ao encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida. Para o tricentenário, a ser comemorado em 2017, o “Jubileu 300 anos de bênçãos”, devotos de várias arquidioceses terão acesso a uma imagem peregrina da padroeira, compartilhando a emoção de uma visita ao santuário nacional. Apropriadamente, a oração composta para essa data especial traz uma das mais belas reflexões sobre a história brasileira: “Para todos tendes sido bênção: peixes em abundância, famílias recuperadas, saúde alcançada, corações reconciliados, vida cristã reassumida”.

José Cordeiro

Jornalista e escritor. É pesquisador da iconografia da imagem de Nossa Senhora Aparecida e do Santuário Nacional. Autor de Aparecida: devoção mariana e a imagem padroeira do Brasil. São Paulo: Cultor de Livros, 2013. E-mail: [email protected]