Roteiros homiléticos

13 de novembro – 33º DOMINGO DO TEMPO COMUM

Por Pe. José Luiz Gonzaga do Prado

O dia do Senhor está próximo

I. Introdução geral

No dia 11 de setembro de 2001, talvez mais completamente do que tinha sido planejado, foram destruídos os dois prédios do chamado centro do comércio mundial. Foi um fim de mundo. Entretanto, ninguém viu no fato a necessidade de uma mudança nos rumos da humanidade: fazer que não seja o comércio, o “mercado”, o único governante do nosso mundo. A reação foi apenas maior violência, agressão armada e econômica. A possível razão dos “inimigos” nem foi considerada.

O Evangelho deste domingo fala da destruição de Jerusalém, ocorrida no ano 70. Começa com a admiração das pessoas pela grandeza, beleza e riqueza do Templo e com a previsão de Jesus: “Não ficará pedra sobre pedra”. No final, diz que os discípulos devem sobreviver por sua perseverança ou resistência.

Estamos chegando ao final do ano litúrgico, e isso nos faz pensar no fim, pois nada deixa de ter o seu término. As grandes crises, as catástrofes da natureza ou das estruturas humanas são ocasião de nova tomada de posição. A própria palavra crise quer dizer julgamento. E tudo nos lembra o fim de cada um e a necessidade de mantermos a coerência, pois só a fidelidade a si mesmo e ao projeto de Deus é capaz de salvar da destruição total. Mantida essa coerência, a crise, o Dia, é de salvação.

II. Comentários aos textos bíblicos

  1. I leitura: Ml 3,19-20a

O último livro da coleção dos Profetas termina anunciando o Dia do Senhor, dia de condenação dos perversos e de alívio para os justos. Responde aos que pensavam: “Não vale a pena servir a Deus! Que proveito a gente tira guardando os seus mandamentos ou caminhando amargurado na presença do Senhor? Pois, então, vamos dar os parabéns aos atrevidos, eles progridem praticando injustiças, desafiam a Deus e acabam salvando-se” (vv. 14-15).

O Dia do Senhor há de chegar “como forno aceso a queimar”. Há de destruir os atrevidos, como se fossem palha. Mas, “para vocês que buscam seguir a lei do Senhor, o sol da justiça há de brilhar”, diz o texto.

Quando se fala hoje em apocalipse, em julgamento final da humanidade, geralmente se pensa em destruição indiscriminada de tudo e de todos. Frequentemente se cita a Bíblia como testemunha que anuncia uma próxima catástrofe final e universal. Contudo, o castigo que os profetas, como Malaquias, anunciam é apenas para os maus, pois, para “os que temem o Senhor”, o Dia traz “o alívio em suas asas”.

  1. Evangelho: Lc 21,5-19

 A destruição do Templo e da cidade de Jerusalém foi um fim de mundo. É disso que o Evangelho nos fala. Firmes até o fim, os cristãos escapam da destruição. O Evangelho não fala do fim do mundo, do final da história da humanidade, mas de um fim que é novo começo, de um fim que está sempre acontecendo.

A destruição de Jerusalém foi, para o cristianismo inicial, algo parecido com a morte da mãe antes do corte do cordão umbilical. Os primeiros cristãos estavam ainda muito ligados à religião judaica. Com a grande revolta do ano 66 e a destruição do Templo e da cidade de Jerusalém no ano 70, toda a estrutura física e humana daquela instituição judaica foi demolida. Foi um fim, mas também novo começo.

Sinais de que a hora da destruição está chegando serão os fatos ligados à revolta judaica. Na Galileia, grupos de pequenos proprietários, em consequência da exploração exercida pelo império romano e das altas taxas de juros cobradas pelos judeus ricos, perderam tudo o que possuíam e passaram a formar quadrilhas de assaltantes, então chamados de lestês, bandidos. Chegavam a assaltar uma caravana romana e depois repartir os alimentos nas aldeias, pois o povo morria de fome. No ano 66 (36 anos depois da morte de Jesus), eles entraram em Jerusalém, queimaram os documentos de suas dívidas, que lá estavam, e dominaram a cidade. Foi a grande revolta.

Seus líderes passaram, logo em seguida, a competir entre si, cada qual reivindicando o título de Messias, pretendendo ser a realização das esperanças de todo o povo. Cada um dizia: “O Messias, o salvador da pátria, sou eu!”, “chegou a hora!”. O Evangelho aconselha os discípulos de Jesus a não acreditar nisso nem se apavorar com a guerra em curso.

Como era de esperar, Roma não ficou passiva; ao contrário, mandou seus exércitos que estavam na Síria invadir a Palestina e acabar com a “brincadeira”. Isso, em decorrência também da momentânea instabilidade política em Roma, demorou algum tempo: só no ano 70 (quatro anos depois) a cidade de Jerusalém foi destruída e os últimos focos de resistência, alguns anos depois, foram eliminados.

E os cristãos? Não devem participar da loucura da revolução nem ficar apavorados, apesar de perseguidos por todos os lados. Especialmente nessas circunstâncias, a fidelidade a Jesus cria problemas até mesmo dentro de casa. Quantas vezes os mais próximos é que vão denunciar o discípulo, que age e fala de maneira contrária aos critérios deste mundo (que são os mesmos tanto do lado dos revoltosos quanto do lado do império romano)? Devem, no entanto, os discípulos ficar firmes no testemunho de Jesus e ser coerentes até o fim. O que salva, diz Jesus, não é filiar-se a um dos dois lados, mas a coerência resistente até o fim.

  1. II leitura: 2Ts 3,7-12

 Entre as comunidades que são Paulo havia fundado, muitas pessoas insistiam na expectativa próxima da parúsia, ou segunda vinda de Jesus. Daí surgiu esta maneira de pensar: “Como Jesus volta logo e resolve todos os nossos problemas, ninguém precisa mais cuidar de ter um trabalho nem se preocupar com os rumos que o mundo vai tomando; é só esperar mais um pouco, que tudo estará resolvido. Para sobreviver até lá, dá-se um jeito, outros ajudam, falta pouco tempo para a vinda gloriosa de Jesus...”.

Foi então que a segunda carta aos Tessalonicenses veio esclarecer a questão com a autoridade do próprio Paulo. O trecho de hoje vai direto ao assunto.

O testemunho do próprio Paulo é fundamental. Na primeira carta aos Tessalonicenses (2,9), ele lembrava que, quando lá esteve evangelizando da primeira vez, trabalhava dia e noite para não ser pesado a ninguém.

Como disse no capítulo 9 da primeira carta aos Coríntios, ele teria o direito de ser mantido pela comunidade, mas o dispensou. Fez isso em Corinto para manter sua independência e não prejudicar a pregação do Evangelho; fez isso em Tessalônica por coerência com os fatos e por solidariedade com os trabalhadores braçais, os primeiros a aceitar sua pregação. O texto de hoje vê aí o exemplo de amor ao trabalho, que sustenta e dignifica a pessoa. Era isso que aqueles cristãos precisavam ouvir.

III. Dicas para reflexão

 Quando leem essas passagens do Evangelho, muitos ainda pensam em um fim de mundo como catástrofe final da humanidade, que ninguém quer ver. Há os que, apoiados nessas palavras da Escritura, vivem anunciando que o fim do mundo está próximo. Nada disso. A crise pode ser dura, difícil, dolorosa, mas é novo começo, abertura de novos horizontes.

A cada momento, um mundo está acabando e outro, começando. O importante é saber ler os sinais dos tempos e estar preparados para o novo começo.

É preciso saber descobrir em cada acontecimento, por menos importante que pareça, o mundo velho que está acabando e a novidade de vida que começa, o horizonte novo que se abre. Em todo acontecimento, uma crise se revela, e em toda crise, uma ou mais portas se abrem.

Quando uma porta se fecha, duas se abrem, basta ter olhos para ver.

Porque esperamos de Deus a intervenção final e decisiva na história para estabelecer o seu reinado, não vamos ficar omissos, deixar-nos vencer pela preguiça, desistindo da busca por outra Igreja possível e por outro mundo possível.

Da mesma forma que rezamos no Pai-nosso “o pão nosso de cada dia nos dai hoje”, mas não deixamos de ir à luta pelo pão, assim também, porque pedimos que sua vontade aconteça “na terra como no céu”, não vamos abandonar a luta pela construção da nova sociedade, diferente da que aí está, de outro mundo, que comece a realizar no presente o que esperamos para o futuro.

Na última ceia, Jesus estava para ser preso e condenado à mais humilhante das mortes. Sabia que iria ficar sozinho. Mesmo assim, ao passar o pão para que cada qual tirasse seu pedaço, disse: “É o meu corpo, sou eu, que me entrego por vocês”. Na missa, lembramos o que ele fez, mandando-nos fazer o mesmo. Aí está a resistência que salva.

Pe. José Luiz Gonzaga do Prado

Mestre em Teologia pela Universidade Gregoriana de Roma e em Sagrada Escritura pelo Pontifício Instituto Bíblico. Autor dos livros A Bíblia e suas contradições: como resolvê-las e A missa: da última ceia até hoje, ambos publicados pela Paulus.