Carta do editor

julho-agosto de 2015

Maria na teologia e na pastoral

Caros leitores e leitoras,

 Graça e paz!

 Maria tem um papel significativo no mistério da salvação, de Cristo e da Igreja. Ela nos ajuda a fazer o elo entre os quatro tempos histórico-salvíficos, porque perpassou todos eles: 1) ela pertence ao Antigo Testamento (é reconhecida como a Filha de Sião, categoria usada no AT para personificar o povo de Israel em uma mulher); 2) acompanha o tempo de Cristo terreno como discípula fiel (Lucas); 3) está presente no início da Igreja (At 1,14); 4) inaugura o tempo da humanidade totalmente redimida em corpo e alma no céu. Tanto na Escritura como na Patrística e no Magistério da Igreja, Maria aparece como colaboradora e discípula fiel, de forma sempre orientada para os mistérios centrais da fé. Os primeiros escritores da Patrística focalizaram sobretudo sua fé e obediência, superando a desobediência de Adão e Eva. A figura de Maria tem mobilizado muitas devoções e atraído multidões de fiéis em todo o mundo católico, fazendo parte da identidade da Igreja.

Geralmente se costuma chamar as práticas e devoções muito difundidas de “populares”, mas, no artigo a seguir, o ir. Afonso Murad chama a atenção para um aspecto atual muito importante no que diz respeito a essa questão. Com o advento da sociedade midiática e da cultura urbana, sobraram poucas práticas autenticamente populares. Há na atualidade a devoção midiática, que não é simplesmente popular, nem na sua origem nem no protagonismo. São práticas devocionais geradas, apoiadas e difundidas por pessoas e grupos organizados, nos quais se incluem padres, leigos, institutos religiosos, novas comunidades e movimentos eclesiais bem determinados, sendo fato que alguns desses protagonistas “têm pouco senso eclesial. Sobrepõem-se às comunidades locais, paróquias e dioceses. Nutrem forte espírito corporativo e megalomania”.

Seja na forma de devoções populares ou midiáticas, por vezes surgem excessos, certos desvios, exageros, carências catequéticas, práticas ou títulos esdrúxulos dados à mãe do Senhor, alguns podendo beirar a heresia. Coisas que não a engrandecem, mas deturpam sua verdadeira grandeza na história de Cristo e da salvação.

Por um lado, cabe a sensibilidade e o respeito às práticas devocionais. Por outro, não convém contentar-se com o sucesso fácil e com a superficialidade, ter medo de frear os exageros e omitir-se. São necessários cuidado e esforços para purificar, evangelizar e aprofundar as devoções e centrá-las em Cristo e no Reino de Deus (cf. DAp 262), atendendo a própria Maria, que, no evangelho, diz aos “servos”: “Fazei aquilo que ele vos disser”.

O trabalho pastoral, nesse sentido, implica desvelar ao povo a figura da mãe de Jesus como a grande crente, a discípula fiel e companheira de Jesus. Maria não é apenas a mãe amorosa, mas tem esses outros aspectos igualmente muito importantes, ressaltados no evangelho e relembrados pela Lumen Gentium. Atenta ao seu Filho, ela passa de mãe biológica de Jesus a membro efetivo da nova família de seus seguidores.

Ela é modelo para a Igreja, na fé, na caridade e na união com Cristo, nas disposições com que a mesma Igreja o invoca e, por meio dele, presta culto ao Pai (Marialis Cultus, n. 16). Ela acolhe tão intensamente a vontade de Deus e seu Espírito, a ponto de traduzi-los em fecundidade material. Toda a história da salvação encontra ressonância em Maria: ela porta e traduz as esperanças messiânicas do povo da antiga e da nova aliança, algo que é sintetizado no seu cântico, que mostra a atenção de Deus aos fracos da história e a participação dela nessa atenção. Prestar autêntico culto a Maria é reconhecer essas suas atitudes fundamentais e esforçar-se por praticá-las.

 Pe. Jakson Alencar, ssp
Editor