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Publicado em número 207 - (pp. 2-7)

Que Pai é Deus? Meditação bíblica para Ministros Eclesiais

Por Prof. José Luiz Gonzaga do Prado

UM FATO: Sirlene sempre me falava com entusiasmo de duas irmãzinhas, uma de cinco e outra de três anos, que frequentavam a Escola Infantil Pequeno Príncipe, onde ela trabalhava. O pai das meninas estava separado e vivia ameaçando vir em casa matar a esposa e a sogra, mãe e avó, com quem viviam as meninas. E uma tarde aconteceu: Vieram buscar as meninas mais cedo, pois sua mãe estava morta, e a avó, hospitalizada, com ferimento a bala. Passado o momento do trauma, a avó, restabelecida, continuou com as meninas. Certo dia a maiorzinha chegou à escola dizendo: “Tia, a avó está ensinando a gente a rezar. Quer ver: Em nome do Pai e do Filho… por que é que não tem mãe?”.

Para essas duas cabecinhas, pai é quem lhes tirou o chão de debaixo dos pés. Para elas, “pai” é o diabo!

 

UMA CONSIDERAÇÃO: Teremos, então, de passar a chamar a Deus de mãe? Seria até interessante, para fazer justiça aos valores femininos. Mas e aquele menino de 14 anos que, entre outras, roubou a arma do Delegado? Quando o Promotor de Justiça, tentando uma recuperação pela via do sentimento, lhe falou em mãe, ele respondeu: “Eu quero lá saber de mãe?! Ela me largou sozinho na rua lá em São Paulo e foi pra zona! Eu quero mais é ser um bandido famoso!”.

Como falar de Deus? Para sermos exatos, não podemos falar — qualquer analogia está sempre sujeita a mal-entendidos.

 

I. “PAI” DESDE QUANDO?

Velhas orações em inúmeras religiões antigas dão a Deus o epíteto de pai. Vamos nos contentar com dois estoicos, trezentos anos antes do Novo Testamento: Arato e Cleanto.

O primeiro, diz em seus Phainumena: “Que todo cântico comece por Zeus!… Tudo está cheio de Zeus… temos todos necessidade de Deus. Tanto é, que somos de sua raça. E ele como pai muito amoroso, dá aos homens sinais propícios…” (cita, então, os tempos e estações do ano, que orientam a agricultura). “Salve, Pai, soberano maravilhoso, poderoso benfeitor dos mortais”.

Cleanto, em seu Hino a Zeus, saúda “o mais glorioso dos Imortais”, “onipotente”, “autor da Natureza”, descreve poeticamente sua presença e atuação na criação e governo do universo e, depois, pede: “Salva os homens da triste ignorância, expulsa-a, ó Pai, para longe do nosso coração”[1].

É de notar, apenas, que essas invocações a Zeus como pai estão dentro do clima emocional da poesia e da oração, e são justificadas pelas afirmações de sua atuação na criação, na origem e governo do universo. Escudadas no conceito de Zeus-Criador, essas afirmações, pouco frequentes e parecendo ousadas, estão distantes, bem distantes, da nossa intimidade com o “Pai do céu”.

 

II. E O ANTIGO TESTAMENTO?

No Antigo Testamento Deus parece também ser chamado de pai por ser o criador. Assim Dt 32,6: “Não é ele teu pai, teu criador? Ele próprio te fez e te firmou”. Só que estamos num contexto de eleição do povo de Israel: por ter escolhido e formado, criado, aquele povo, firmando com ele uma aliança, Iahweh é o seu pai, o pai do povo eleito.

Em Is 64,7 o apelativo pai está em paralelo com oleiro. E o trabalho do oleiro, além de lembrar o ser humano feito do barro, traz consigo a ideia de um trabalho artístico, cuidadoso, carinhoso. O contexto todo, porém, dessa oração é um pedido de perdão, misericórdia, complacência, diante da situação miserável do pós-exílio. Deus é o pai carinhoso que nos fez seu povo, e nós, miseráveis, estamos em suas mãos como o barro nas mãos do oleiro.

Pouco antes e no mesmo contexto, em Is 63,16, duas vezes Iahweh é chamado de pai, aqui em paralelo com go’el, libertador, restaurador. E há uma comparação com os antepassados, Abraão, Israel: mesmo que eles não tomem conhecimento de seus filhos, Iahweh, não; ele é um pai amoroso, compassivo, preocupado com seus filhos.

Em Jr 3,4, mesmo em se tratando de crítica à oração vazia, Deus “pai” está em paralelo com amigo ou companheiro de infância. Pai é Iahweh, o Deus presente, que aconteceu na história do povo, cuja infância é o êxodo. E o versículo 19 do mesmo capítulo confirma a alusão ao êxodo: Deus é pai, porque escolheu o povo e fez uma aliança com ele, muitas vezes infiel como a mais desavergonhada das esposas.

Quando a teologia da monarquia fez com que a aliança de Iahweh não fosse mais com o povo como um todo, mas com Davi, o rei, este passou a ser o Filho de Deus. “Tu és o meu filho, hoje eu te gerei”. Nessa linha temos 2Sm 7,14, 1Cr 28,6 e tantos paralelos. Deus, agora, é pai do rei, a ponto de “Filho de Deus” vir a se tornar um título messiânico.

O povo, porém, especialmente sua parte mais sofrida, não esqueceu que Deus é pai. Em Jeremias 31,9, prometendo a volta do exílio, Deus diz: “sou um pai para Israel, Efraim é o meu primogênito”. E a passagem não fica distante da promessa de uma nova aliança (31,31ss).

No Salmo 68,6 ele é “pai dos órfãos e defensor das viúvas”. E no mais recente texto do Antigo Testamento a chamar Deus de pai, (Eclo 51,10) ele é assim chamado para que não abandone o fiel “no dia da provação, no tempo dos orgulhosos…”. O texto grego (o canônico) está corrompido, mas o texto hebraico, descoberto em fragmentos a partir de cem anos atrás, diz: “Iahweh, tu és o meu pai, porque és o herói que me salva”[2].

 

III. AGORA, O NOVO TESTAMENTO

É evidente que não podemos analisar como fizemos com relação ao Antigo, a quase totalidade das passagens onde o NT chama a Deus de pai. Só em João temos 118 vezes a palavra “pai” aplicada a Deus, e em Mateus, 45. Pode-se dizer mesmo que é esta a grande novidade do Novo Testamento.

 

1. Nos escritos de Paulo

Paulo foi, sem dúvida, o primeiro autor do NT. Escreveu na década de 50, enquanto o mais antigo dos Evangelhos, o de Marcos, foi escrito quase vinte anos depois. O primeiro escrito de Paulo e, portanto, do NT é, segundo a grande maioria dos autores, a Primeira Carta aos Tessalonicenses.

Aquela pequena comunidade de trabalhadores braçais de origem gentia e ainda mal evangelizada (1Ts 3,10) é para Paulo “a igreja dos tessalonicenses que aderiu a Deus como pai”. A expressão “em Deus Pai” a nós soa vaga e de pouco sentido; é, porém, o que caracteriza aquele grupo humano — diríamos hoje — como comunidade eclesial. São esses tessalonicenses que, abandonando os ídolos (1Ts 1,9), passaram a cultuar o Deus vivo e verdadeiro. Aderiram a Deus como pai e ao Messias Jesus como Senhor.

Que teria a ver uma coisa com outra: abandonar os ídolos com aderir ao Deus vivo, Deus vivo com Deus Pai, Deus Pai e Jesus como Senhor?

O único Senhor, o verdadeiro Imperador, para esses tessalonicenses, é agora o “rei” crucificado, o messias Jesus. Assim também, aderir a Deus como pai não é ficar numa frase feita, mas significa que Deus, Pai daquele crucificado, pode ser também nosso Pai. Isso é uma revolução na cabeça daqueles pobres trabalhadores braçais que, além do mais, ainda sonhavam com o mito de Cabiros, o defensor dos pobres, assassinado, que voltaria um dia para restabelecer a justiça[3].

Logo adiante, no v. 3 Paulo volta a insistir que Deus é nosso pai e, no v. 4, que somos irmãos — e os cristãos tessalonicenses são queridos por Deus, que os escolheu. Somos filhos escolhidos, não nascidos ao acaso ou pela lei natural.

Essa escolha se comprova para os tessalonicenses não a partir de uma tese ou de uma definição dogmática, mas a partir dos acontecimentos: o que ocorre com eles é o mesmo que ocorre com Paulo, com as comunidades da Judeia, e com Jesus.

Jesus é o Filho fiel ao Pai que, por esta fidelidade, foi perseguido e morto; mas Deus Pai interveio, ressuscitando-o dos mortos como Messias e Senhor. Aos seus discípulos vai ocorrer o mesmo que aconteceu com ele, até que, numa intervenção final, ele nos livre da “ira futura”[4].

Paulo é, primeiro, pequenino, criança (1Ts 2,7)[5], infantil, filho totalmente dependente do pai. Obediente, ele se torna mãe ou ama de leite, que, com o leite, sofre, é perseguido, dá a própria vida aos filhos (2,7b-10) e, aí então, ele se torna apóstolo de Cristo, com autoridade de pai (2,11-12).

Também os cristãos tessalonicenses acolheram com entusiasmo e alegria a Palavra, tornaram-se filhos de Deus e irmãos de Paulo; logo vieram as dificuldades e perseguições, mas Deus interveio fazendo com que sua adesão sincera, alegre e entusiasta ao Messias Jesus fosse evangelizadora de outras comunidades e, assim, eles se tornaram missionários (1,4-10). O mesmo ocorreu com os cristãos da Judeia (2,3-16) e deverá ocorrer em outros lugares da Macedônia e da Acaia.

 

Meditando: Na Igreja de Jesus Cristo ninguém pode chegar de paraquedas com a autoridade de pai (padre). Primeiro tem de ser criança, filho obediente; depois, sacrificar-se e sofrer como mãe ou ama de leite, que dá do seu sangue para alimentar o filho. Depois, então, poderá ter autoridade de pai, que anima e orienta, fica feliz com o crescimento do filho; diferente de um “enfant gâté” ou um déspota, cheio de vontades.

E outra: não é buscando alimento espiritual em movimentos disponíveis no shopping religioso atual, que a pessoa se tornará capaz de contribuir para a formação de comunidades verdadeiramente eclesiais; é bebendo do próprio poço, buscando viver a mesma fé que tem por obrigação fomentar. Senão, poderemos estar querendo alimentar com maionese a máquina de fazer tijolos.

Nos outros escritos autenticamente paulinos, Deus é chamado de Pai nas saudações iniciais, com fórmulas mais ou menos estereotipadas, mas que lembram a correspondência entre “o Messias Jesus” e “Deus, nosso Pai”. O mesmo paralelismo aparece também em 1Cor 8,6.

No início da ação de graças de 2Cor — introdução de uma carta de reconciliação com a comunidade após fase de grande tensão—, Paulo se refere ao “Pai das misericórdias”, ou Pai misericordioso, e “Deus de toda a consolação” ou Deus que consola plenamente.

Na saudação da polêmica carta aos Gálatas, Paulo se diz Apóstolo não por ninguém outro que “por Deus Pai, que ressuscitou o Messias Jesus”, confirmando que Deus pode se dizer Pai, porque ressuscitou o pobre e massacrado Jesus, fazendo dele o Messias. O mesmo se vê na carta aos Filipenses (2,11), onde a exaltação de Jesus como Senhor é para (ou na ou com) a glória de Deus Pai. E também se vê na consumação final (1Cor 15,24), quando o Ressuscitado, depois de submeter a si todas as coisas, entrega o Reino a Deus Pai.

Em Gálatas e em Romanos temos dois textos clássicos que conservam o vocativo aramaico Abbá, que quer dizer “Papai”, usado, sem dúvida, nas orações dos cristãos primitivos.

O de Gálatas (4,3-7) está orientado para a afirmação de que o cristão é filho, portanto livre e herdeiro. Não é escravo, como escravos dos ídolos tinham sido os cristãos gálatas, e escravos da Lei estavam querendo se tornar. A escravidão à idolatria ou à Lei, anterior à chegada de Cristo, Paulo a compara à situação da criança (népioi), filho e herdeiro, mas obrigado a obedecer ao pedagogo até a idade determinada pelo pai. Jesus é o Filho, livre e herdeiro, mas fiel e obediente, nascido de uma mulher e submisso à Lei, para da Lei nos libertar, para marcar o momento determinado pelo Pai — e para alcançarmos a autonomia. E somos filhos, não por uma lei, um decreto, mas porque recebemos o espírito do Filho.

Em Romanos (8,14-17), Paulo está falando do espírito, que se opõe à Lei, e, então volta, em outra perspectiva, o tema da escravidão e da liberdade: “…não recebestes espírito de escravos, mas de filhos, com o qual clamamos: Abbá, isto é, papai!”. Conclusão: somos filhos e herdeiros com Cristo, junto com quem enfrentamos os sofrimentos e somos glorificados (8,18-19).

 

Meditando: Chamar a Deus de Pai, ser filho de Deus, significa ter o espírito do Filho, fiel e obediente, capaz de dar a vida. Significa ser livre, não havendo necessidade de um elenco de leis que ensinem a agradar o pai. Coração de filho não precisa aprender a agradar o pai. Muita formalidade até provoca desconfiança.

 

2. Deus Pai em Mateus

Entre os sinóticos Mateus é o que maior número de vezes dá a Deus o apelativo de Pai. Foi por isso que o ano de Mateus, no lecionário dominical, foi escolhido para se refletir sobre Deus Pai. Aqui vamos acompanhar Mateus fazendo uma ou outra comparação sinótica que, ao mesmo tempo, mostre outras perspectivas e deixe mais clara a acentuação própria de Mateus.

Autor e comunidade do primeiro Evangelho não escondem seu enraizamento judaico. E o judeu fervoroso só se refere a Deus, a quem é dada a glória pelos séculos, com o máximo de respeito — o que exige certa distância. Assim faz Mateus quando se refere a Deus, seja como pai de Jesus Cristo, seja como pai dos discípulos.

 

2.1. Deus, Pai de Jesus Cristo

Das 19 vezes que o Evangelho de Mateus chama a Deus de Pai de Jesus Cristo, em 8 cria-se distância respeitosa com a expressão “que está no céu”. É sempre Jesus que está falando em se fazer a vontade (7,21; 12,5), confessar, negar (10,32-33), ver a face (18,10) do “seu Pai que está no céu”, ou, então é o “meu Pai que está no céu” quem revelou (16,17), quem não plantou (15,13), quem fará como o senhor do servo perdoado que não perdoou (18,35).

A maioria dos casos não tem paralelos em Mc e Lc. Confessar ou negar “diante do meu Pai que está no céu” de Mt 10,32-33, em Lucas é confessar ou negar “diante dos anjos de Deus”. Se em 12,21, irmão de Jesus é quem faz a vontade do “meu Pai que está no céu”, em Mc e Lc irmão é quem pratica a vontade ou a palavra “de Deus”.

A expressão “Pai, Senhor do céu e da terra” deve ser própria da Quelle, porque o trecho todo (Mt 11,25-27), ação de graças porque o Pai esconde “estas coisas” aos sábios e criteriosos, mas as revela aos népioi, pequeninos, crianças, se encontra transcrito, palavra por palavra, tanto em Mt como em Lc. No Evangelho de Mateus, é só aqui que Jesus se dirige a Deus chamando-o simplesmente de “Pai”, com a intimidade do “Papai” correspondente ao Abbá aramaico. E só nesse trecho se encontram 5 referências a Deus como Pai de Jesus Cristo, chamado de Filho que bem conhece o Pai e o revela. O Filho é o primeiro népios, pequenino, criancinha, porque é só a esses que o Pai se revela, e só o filho pode revelá-lo.

As 6 vezes restantes em que Deus é chamado Pai de Jesus Cristo estão num contexto pascal: “Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice!” (26,39); “para meu Pai enviar doze legiões de anjos…” (26,53); “até beber o vinho novo no reino…” (26,29); “vinde benditos… para o Reino…” (25,24); “sentar-se ao meu lado é para aquele para quem foi preparado por meu Pai” (20,23).

Nesse último caso, Marcos deixa subentendido o nome de Deus com o simples emprego da voz passiva sem indicar o agente. Na oração no horto das Oliveiras diz: “Abbá, Papai, se é possível”. E Lucas faz o mesmo, apenas não citando a palavra em aramaico. Vê-se que, como bom judeu, Mateus tem receio de uma intimidade muito grande, mas insiste mais que Marcos e Lucas em que Deus é o pai de Jesus e que Jesus é filho de verdade, obediente e fiel.

 

2.2. Pai nosso

É muito próprio de Mateus dizer que Deus é nosso Pai. O Evangelho de João chama a Deus de Pai 118 vezes contra 45 vezes de Mateus, porém sempre Pai de Jesus ou simplesmente o Pai, só em 20,17 diz “meu Pai e vosso Pai”. Em Mateus, todavia, Deus é chamado de “nosso Pai” com a mesma frequência com que é chamado “Pai de Jesus”.

A expressão mais frequente é “vosso Pai que está no céu”, para não negar a origem judaica e a distância respeitosa[6].

É a prática cotidiana do discípulo que glorifica o Pai (5,16); ser verdadeiro filho dele significa não fazer discriminações (5,45), e nisso precisamos ser perfeitos como ele (5,48); dele é que se deve esperar recompensa, a ele é que se deve procurar agradar, não aos homens (6,1); é ele quem alimenta as aves e sabe quais as nossas necessidades básicas (6,26.32); a vontade dele é que não se perca nem um dos pequeninos (18,14). Ele está também no escondido e vê o escondido (6,4.6.18).

Umas cinco vezes aparece simplesmente “o vosso Pai” sem outra conotação. Ele sabe de que precisamos antes de qualquer oração (6,8); ele perdoa a quem perdoa e não perdoa quem não perdoa ao companheiro (6,14-15); é o espírito do vosso Pai que falará por vós (10,20); sem ele nem um pardal cai ao chão (10,29) e é no Reino do vosso Pai que os justos brilharão (13,43).

 

Meditando: Ser filho de quem é Pai de todos é chegar também a ser pai para todos, caprichando para não deixar ninguém esquecido ou discriminado. É batalhar para que se realize sua vontade, o sonho, aqui na terra, de um mundo sem desigualdades — que a gente faça vir o seu Reino, pois isto é que santifica o seu nome. Pão? Basta pedir o de hoje — guardar para amanhã pode provocar a falta para alguém hoje. Ele alimenta até as aves — e sabe muito bem. Pensamos demais em nós mesmos e pouco no sonho dele. Estamos sempre devendo — mas ele perdoa, se nós nos perdoamos. A tentação, porém, continua forte, só a confiança nele nos livra dela.

Mateus chega ao máximo quando proíbe chamar de “pai” a quem quer que não seja Deus. Está no capítulo 23, nas grandes inventivas de Jesus contra o rabinismo farisaico. Essas palavras poderiam fazer um bem enorme, se fossem meditadas com maior frequência pelos dirigentes eclesiásticos de hoje. É evidente que Jesus não proíbe chamar de pai ao pai natural, mesmo que seja um desnaturado. Ele diz em Mt 23,9: “Não chameis na terra a ninguém de ‘pai’, porque um só é o vosso Pai, aquele que está no céu”. Trata-se do título de “Pai” que se davam os rabinos como diretores espirituais. Eles estariam se endeusando? E quem faz questão de ser chamado de “Padre”, estará se endeusando também?



[1] LÉVI, Israel, The Hebrew Text of the Book of Eclesiasticus, E. J. Brill, Leiden, 1904, reimpressão de 1951.

[2] FERREIRA, Joel Antônio, Primeira Epístola aos Tessalonicenses, Col. Comentário Bíblico, Metodista-Vozes-Sinodal, 1995, pp. 27-31.

[3] Estas considerações estão calcadas em PATTE, Daniel, Paulo, sua fé e a força do Evangelho, Paulus, São Paulo, 1987.

[4] Grande parte das Bíblias atuais adota a leitura, hoje comprovadamente menos provável, vh,pioi = bondosos. A tendência atual dos autores, incluindo-se aí a Nova Vulgata, é ler nh,pioi = pequeninos, crianças.

[5] Segundo consta em SCHMOLLER, Alfred, Handkonkordanz Zum Griechischen Neuen Testament, Privilegierte Würtemb. Bibelanstalt, Stuttgart, 1960.

[6] Notar que o “Pai Nosso” de Lucas (11,2) começa simplesmente com “Pai” Abbá, “Papai”.

Prof. José Luiz Gonzaga do Prado