Roteiros homiléticos

Publicado em novembro-dezembro de 2025 - ano 66 - número 366 - pp. 32-34

2 de novembro – TODOS OS FIÉIS DEFUNTOS (IP; CL)

Por Ir. Dra. Izabel Patuzzo (IP)* Prof. Ms. Celso Loraschi (CL)** Ir. Dra. Zuleica Aparecida Silvano (ZAS)***

Habitar para sempre na tenda do Senhor

I. INTRODUÇÃO GERAL

Entre as certezas que carregamos em nossa vida de filhos e filhas de Deus está a finitude de nossa existência. Todos passamos pela experiência da partida definitiva de amigos e familiares para a eternidade. Tanto o nascimento como a morte fazem parte do ciclo da vida, da ordem natural. Segundo o ensinamento da Igreja, a morte é o fim de nossa missão na terra e a passagem para o ciclo final da existência, quando entramos na comunhão definitiva com Deus. Nossa caminhada terrena é medida pelo tempo, no decorrer do qual buscamos crescer e amadurecer na relação de amor com Deus e com aqueles com os quais convivemos. Nessa caminhada, envelhecemos, como acontece com todos os seres vivos da natureza, e a certeza da morte nos faz lembrar que nosso tempo aqui é limitado.

O sentido de urgência que esse tempo limitado desperta pode nos tornar conscientes, a cada dia, da importância de qualificar nossas relações familiares e de amizade, na busca de um trabalho digno e construtivo para nós e para os outros. E assim, atentos às necessidades dos que nos rodeiam, alcançar a plenitude de nossa vida espiritual. Que nossa passagem por este mundo seja um testemunho, uma contribuição à humanidade. Como cristãos, somos movidos pela fé na ressurreição, e nossa mortalidade futura deve nos inspirar a viver na expectativa de estar eternamente com Deus.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

1. I leitura (Sb 3,1-9)

O texto do livro da Sabedoria nos enche de confiança e nos ensina que Deus cuida de todas as pessoas que vivem segundo sua justiça. Ele não é indiferente ao sofrimento de quem cumpre seus ensinamentos. Sua graça e misericórdia se estendem a todos os que depositam nele sua confiança. A leitura nos apresenta uma vida futura feliz, na qual iremos experimentar a convivência com Deus; por isso, exorta-nos a viver na justiça. A pessoa sábia tem uma conduta virtuosa e confia em Deus; essas qualidades tornam possível a união com ele. Quem escolhe os caminhos do Senhor não está livre de sofrimentos e provações, mas quem espera nele compreenderá a verdade e o amor, pois somos chamados para a imortalidade. Por conseguinte, o autor sagrado afirma que a vida do justo está nas mãos de Deus. Os seres humanos são destinados à imortalidade, dom divino.

2. II leitura (Ap 21,1-5a.6b-7)

O tema central da segunda leitura é a descrição do mundo novo que Deus está para criar. A visão de João do novo céu e da nova terra remete à realidade de um mundo em que a violência, a maldade e a injustiça já não têm lugar. Desse modo, Deus pode estabelecer sua tenda no meio do povo, enxugar toda lágrima e eliminar todo sofrimento que aflige a humanidade. O primeiro céu e a primeira terra, que já passaram, simbolizam o mundo corrompido pelo pecado. Somente Deus é capaz de recriar o novo paraíso.

Sua voz, vinda do trono, fala diretamente com os fiéis ouvintes, afirmando que ele remove toda origem da tristeza e declarando que irá renovar o mundo. Esse texto encoraja os fiéis a considerar o poder e a confiabilidade de Deus. Aqueles que permanecerem fiéis a Jesus Cristo experimentarão a nova criação. O próprio Senhor declara que tudo está consumado; ele tem o poder de renovar todas as coisas, todas as pessoas e o coração de cada um, pois está no princípio e no fim de tudo que existe. Tem controle sobre a história e garante sua bênção aos vencedores, ou seja, a todas as pessoas que vivem segundo sua justiça. Estas não experimentarão a segunda morte, que, na linguagem do Apocalipse, significa a morte espiritual. Ser vencedor no caminho do discipulado é um desafio, pois exige uma vida inteira de fidelidade a Jesus Cristo e a capacidade de resistir a todas as propostas daqueles que se opõem aos ensinamentos das Escrituras.

3. Evangelho (Lc 7,11-17)

O relato do episódio da ressurreição do filho da viúva de Naim encontra-se somente no Evangelho de Lucas. Tem estreita ligação com um episódio da vida de Elias (1Rs 17,17-24): ambos tratam da morte do filho único, cuja mãe é viúva. Os filhos únicos representam a garantia de futuro para as famílias. A situação de morte não pode deixar acomodadas as pessoas que servem a Deus.

Nos Evangelhos, os sinais de cura e libertação, em sua maior parte, são realizados por Jesus em atendimento à súplica dos necessitados. No caso da viúva de Naim, porém, é Jesus mesmo que toma a iniciativa de ir ao seu encontro. “Seus discípulos e numerosa multidão caminhavam com ele.”

Naim é uma cidade amuralhada. Do seu interior para a porta vem uma procissão, acompanhando o enterro do filho único de uma viúva. “Grande multidão da cidade estava com ela.” Duas procissões em sentido contrário encontram-se na “porta da cidade”. Jesus vê a situação em que se encontra aquela mãe e fica comovido, isto é, “ele é movido em suas entranhas”, conforme o verbo grego splanchnizomai. É o mesmo sentimento de amor e compaixão que leva o samaritano a socorrer a pessoa espancada e abandonada à beira do caminho (10,33); é também o mesmo sentimento que leva o pai do filho pródigo a ir correndo ao seu encontro, acolhê-lo nos braços e beijá-lo (15,20).

Jesus, movido pela compaixão, dirige-se à mulher com palavras de consolação e esperança: “Não chores”. Não são palavras de meras condolências. Ele se aproxima, toca no esquife e pede que o jovem se levante. Percebem-se, aqui também, como na narrativa de Elias, alguns verbos-chave reveladores da metodologia que proporciona a transformação de uma realidade de morte.

As pessoas que testemunham o fato glorificam a Deus, reconhecem Jesus como profeta e exclamam: “Deus visitou o seu povo”. É o eco do cântico de Zacarias, que bendiz a Deus “porque visitou e redimiu o seu povo e suscitou-nos uma força de salvação” (1,68s). Não é por acaso que Lucas situa o féretro vindo da cidade, lugar onde o poder se articula e se organiza. É como um seio que, ao invés de gerar a vida, provoca a morte. Jesus, força de salvação, vem com outro projeto, que faz parar essa procissão de gente sem vitalidade. Junto com a vida, também restitui ao jovem a palavra. O povo, assim, é chamado a resgatar o direito à palavra e à vida e tornar-se protagonista de uma nova sociedade.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

A fé na vida eterna nos ajuda a adotar um estilo de vida em conformidade com o projeto de salvação que o Senhor nos oferece. Esse projeto de salvação consiste em continuamente nos esforçarmos para crescer na justiça, na concretização do amor ao próximo, na construção de um mundo segundo os ensinamentos de Jesus, buscando não a sabedoria deste mundo, mas a sabedoria divina.

Os sofrimentos da existência presente não são um drama sem sentido e sem finalidade. A liturgia deste dia nos recorda que somos chamados a viver na esperança e na confiança; mesmo em meio a dores, cabe-nos caminhar em direção à vida plena que Deus nos oferece, em comunhão com ele e com todos aqueles que nos precederam nesse caminho.

Podemos fazer hoje a memória dos profetas e profetisas de nossos tempos. Podemos também levantar as situações de morte que nos desafiam hoje e valorizar as diversas ações que estão sendo desenvolvidas em favor da vida, estimulando a participação e a criatividade para novas iniciativas.

Abraçar a fé cristã significa viver na confiança em Deus, que nos oferece uma vida plena. Por isso, nossa tarefa é nos comprometermos com a luta pela paz e pela justiça, na certeza de que as forças do mal não podem pôr em risco a vida que nos anima. Na medida em que nos comprometermos com o mundo novo, adotando atitudes que protegem a vida, estaremos aptos para habitar o novo céu e a nova terra que o Senhor preparou para nós.

Ir. Dra. Izabel Patuzzo (IP)* Prof. Ms. Celso Loraschi (CL)** Ir. Dra. Zuleica Aparecida Silvano (ZAS)***

*da Congregação Missionárias da Imaculada, pime. Mestra em Aconselhamento Social pela South Australian University e em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Doutora em Teologia Bíblica pela PUC-SP.
**mestre em Teologia Dogmática, com concentração em Estudos Bíblicos, pela Faculdade Nossa Senhora da Assunção (SP),
é autor do roteiro do Evangelho de Todos os Fiéis Defuntos e do roteiro da festa da Dedicação da Basílica do Latrão.
***religiosa paulina, mestra em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico (Roma) e doutora em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje), é autora do roteiro da festa da Sagrada Família.