Roteiros homiléticos

2º DOMINGO DO ADVENTO – 10 de dezembro

Por Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj

I- Introdução geral

As leituras de hoje têm duas tônicas complementares: conversão e consolação. Deus está empenhado em nos conduzir para um mundo novo ou realidade nova. Isso nos consola e nos enche de esperança, porque significa que não ficaremos para sempre sofrendo as consequências do egoísmo e há solução para o problema do mal, o qual um dia terá seu fim. No entanto, o mundo novo que nos é oferecido por Deus somente poderá acontecer quando o ser humano fizer uma reforma íntima. Isso exige que estejamos sempre dentro de uma dinâmica de conversão, de transformação do homem velho em nova criatura, que nos empenhemos em pôr em prática a vontade de Deus e caminhemos na fidelidade.

  II- Comentários aos textos bíblicos

1. Evangelho (Mc 1,1-8): Preparai o caminho do Senhor

A liturgia de hoje nos oferece um texto que enfatiza a identidade de João Batista como mensageiro de Deus e iniciador do caminho de Jesus. Portanto, quem quiser celebrar bem o nascimento de Jesus deve passar por João Batista, entendendo o objetivo de sua vinda antes do Cristo.

A figura de João no deserto insere-se no advento do evangelho e do cristianismo, à semelhança da passagem do povo pelo deserto durante quarenta anos, a qual antecipou o nascimento de Israel como um povo consagrado a Deus. O deserto é um lugar de provação intensa ou tentação, mas também evoca o caminho do retorno, conforme as palavras de Is 40,3. Por isso, o evangelho de hoje apresenta João não apenas batizando, mas proclamando um batismo de arrependimento e de conversão. O verbo proclamar indica que o batismo realizado por João não é mero ritual, mas evento de salvação que ele veio para proclamar. Por isso, também, João não batiza em qualquer lugar, mas no rio Jordão, entrada para Israel, à semelhança dos hebreus quando foram libertados da escravidão do Egito e, atravessando o deserto, entraram na terra prometida através do mesmo rio.

Marcos relata que o batismo de João era com água e tinha como objetivo a conversão. Com a chegada do mais forte, ou seja, mais apto, o batismo será com o Espírito Santo e com fogo. Esse que virá, a saber, o Cristo, é que irá realizar a obra de Deus para a qual João está preparando as pessoas.

João Batista está seguro de que a vinda do Cristo trará consigo o fim dos tempos. Por isso, o profeta estabelece um movimento final de conversão, antes do fim iminente. Ele expõe aos seus ouvintes aquilo que considera ser a última oportunidade de conversão, porque, no seu modo de pensar, não haverá mais nenhuma outra oportunidade.

Dessa forma, João fica na fronteira entre o deserto e a Terra Prometida, abordando todos os habitantes de Jerusalém e da Judeia, como um personagem do fim dos tempos, e oferecendo uma oportunidade de conversão, antes da chegada do Cristo, a cada um daqueles que vêm ali e confessam os seus pecados. João nos convida a acolher o Cristo libertador, que nos dá o Espírito Santo para gerar vida nova ao nos introduzir na dinâmica do mundo novo que está por vir, a dinâmica do amor.

2. I leitura (Is 40,1-5.9-11): O Senhor vem para libertar

A primeira leitura nos garante que o Deus de Israel é soberano na história do mundo, embora algumas situações possam ofuscar essa certeza. Na época em que esse texto bíblico foi escrito, o povo de Deus passava por tempos de incerteza. Acontecia a sucessão do império babilônico pelo império persa, ou seja, o povo continuava sob a dominação estrangeira e não sabia se os novos senhores seriam piores ou melhores que os anteriores, situação que trazia uma onda agitada de preocupações.

Então o profeta introduz a boa-nova da redenção (v. 1-11); a mensagem de Deus para o seu povo é de consolo, porque chegou o tempo de redenção. Seu convite é que aceitem a salvação que Deus oferece. O profeta faz esse convite através de um anúncio de esperança. O profeta garante a fidelidade de Deus e a vontade divina de conduzir o povo para a liberdade e a paz.

Uma imagem muito comum na época é usada, relacionada à forma com a qual se faziam as preparações para a viagem de um rei: os vales nivelados, os montes e colinas abaixados, o caminho torto endireitado (v. 4). A voz proclama que Deus vem para levar seu povo da escravidão para a liberdade, da Babilônia para Jerusalém, ao longo de um percurso através do deserto. Deus será como um pastor à frente do rebanho, irá atravessar o deserto à frente de seu povo, que retorna do exílio babilônico para Jerusalém.

3. II leitura (2Pd 3,8-14): O Senhor virá em breve

A segunda leitura nos adverte de que não podemos ignorar que o Senhor é eterno e de que não existe o aparente atraso da segunda vinda de Cristo. A expressão “um dia é como mil anos e mil anos é como um dia” (v. 8) é tirada do Sl 90,4 e não se refere a um milênio como período histórico, mas simplesmente ao fato de que o tempo não afeta o Senhor, porque ele é eterno. Esse aparente atraso no retorno do Senhor, na verdade, deve ser interpretado como uma prova de sua paciência para conosco. É vontade do Senhor que ninguém pereça, mas os pecadores mudem de atitude.

A aparente descrição do fim dos tempos como se todas as coisas fossem desintegrar-se não deve nos meter medo. O autor não está querendo afirmar que tudo vai se acabar com o fogo. Ele usa o símbolo do fogo porque era o principal elemento purificador dos metais na Antiguidade. Era pelo fogo que se mostrava o valor de um metal precioso como a prata e o ouro. Da mesma forma, é nos períodos das maiores provações que se mostra a grandeza de nossa fé e santidade. Portanto,  nossa vida e santidade devemos considerar como metal precioso, enquanto esperamos diligentemente a vinda do Senhor.

A expressão “céus e terra” serve para resumir toda a criação, por isso “novos céus e nova terra” significam apenas uma nova criação. O autor quer mostrar que haverá uma “nova terra onde habitará a justiça”. Ele não está interessado em apresentar um mapa dos eventos futuros, mas apontar para a esperança em transformar o nosso presente. Essa leitura nos convida a uma espera produtiva e transformadora do nosso comportamento. O texto bíblico nos exorta à conversão contínua e à transformação do mundo egoísta em reino de fraternidade e paz.

 

III. Pistas para reflexão

As leituras de hoje enfatizam o consolo por Deus ser eterno e agir sempre em favor de seu povo, mas, ao mesmo tempo, pedem que nos dispamos dos hábitos do comodismo, da indiferença, do egoísmo e da autossuficiência e aceitemos, outra vez, nos deixar guiar por Deus.

É tempo de conversão. Não estamos nos preparando apenas para o Natal em 25 de dezembro. Estamos nos preparando para a segunda vinda de Jesus e para o mundo novo que ele trará consigo. A celebração do nascimento de Jesus é um sinal que aponta para o reino definitivo, e somente participaremos dessa nova criação se mudarmos nosso modo de viver agora.

Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj

Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj, é graduada em Filosofia e em Teologia. Cursou mestrado e doutorado em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, FAJE (MG). Atualmente, leciona na pós-graduação em Teologia na Universidade Católica de Pernambuco, UNICAP. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas – teologia apocalíptica (Paulinas). E-mail: [email protected]