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Publicado em janeiro-fevereiro de 2023 - ano 64 - número 349 - pág.: 16-23

Por uma Igreja Sinodal: Reflexão pastoral

Por Orani João Tempesta, O. Cist.*

1. O SÍNODO, QUESTÕES E ESPERANÇAS

“Amados irmãos e irmãs! Obrigado por estardes aqui na abertura do Sínodo. Percorrendo diversos caminhos, viestes de tantas Igrejas, trazendo cada um, no coração, questões e esperanças; e tenho a certeza de que o Espírito nos guiará e concederá a graça de avançarmos em conjunto, de nos ouvirmos mutuamente e iniciarmos um discernimento no nosso tempo, tornando-nos solidários com as fadigas e os anseios da humanidade. Reitero que o Sínodo não é um parlamento, o Sínodo não é uma investigação sobre as opiniões; o Sínodo é um momento eclesial, e o protagonista do Sínodo é o Espírito Santo. Se não estiver o Espírito, não haverá sínodo” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

O Santo Padre, o papa Francisco, convocou, para outubro de 2023, a 16ª Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos, que tem por tema “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão” e será o ponto alto do processo de escutas diocesanas, nacionais e continentais que tiveram início em 2021. Somos todos convidados a participar na oração e nas demais atividades propostas neste momento de grande graça para a vida da Igreja.

O termo “sínodo” deriva do grego synodos, que significa “reunião”. É composto pelo prefixo syn (junto com / junto de / junto a) e pelo substantivo hodós (caminho). O verbo grego synodéo significa “fazer um caminho com alguém”. A Igreja, ao longo de sua história, concretizou muitos passos e aprendizados. Foi notadamente no Concílio Vaticano II (1962-1965) que ela aprofundou a compreensão de que o melhor jeito de ser e de caminhar, para bem cumprir sua missão, é o “jeito sinodal”.

Ser Igreja sinodal é o esforço coletivo e a busca contínua de aprendermos a “caminhar juntos”, como irmãos e irmãs. É um jeito de ser Igreja no qual cada pessoa é importante, tem voz, é ouvida, capacitada e envolvida na realização da missão. Já não se trata de estar uns acima dos outros, mas de nos colocarmos unidos para, juntos, fazermos a experiência de fé diante dos desafios internos e externos que se apresentam em nosso dia a dia.

2. O ESPÍRITO DO SÍNODO: UNIDADE, COMUNHÃO E FRATERNIDADE

“Vivamos este Sínodo no espírito da ardente oração que Jesus dirigiu ao Pai pelos seus: ‘Para que todos sejam um’ (Jo 17,21). É a isto que somos chamados: à unidade, à comunhão, à fraternidade que nasce de nos sentirmos abraçados pelo único amor de Deus. Todos indistintamente, mas em particular nós, pastores – assim escreve São Cipriano –, ‘devemos manter e reivindicar com firmeza essa unidade, sobretudo nós, bispos, que temos a presidência na Igreja, para dar provas de que o próprio episcopado também é uno e indiviso’ (De Ecclesiae Catholicae Unitate, n. 5). Por isso, no único povo de Deus, caminhemos em conjunto para fazer a experiência de uma Igreja que recebe e vive o dom da unidade e se abre à voz do Espírito” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

Para tornar concreta e visível a sinodalidade desejada por Francisco desde o início de seu pontificado, o Sínodo dos Bispos não está sendo celebrado somente no Vaticano, mas em cada Igreja particular dos cinco continentes, seguindo um itinerário trienal articulado em três fases: escuta, discernimento e consulta.

Cristãos leigos e leigas, sacerdotes, missionários(as), consagrados(as), bispos e cardeais – mesmo antes de discutir, refletir e questionar-se sobre a sinodalidade, na assembleia de outubro de 2023 no Vaticano – vêm se encontrando, portanto, vivendo-a em primeira pessoa. Cada um em sua diocese, com seu papel e em suas instâncias. “Um processo sinodal integral só será realizado de forma autêntica se as Igrejas particulares estiverem envolvidas nele.” Além disso, será importante a participação dos “órgãos intermediários da sinodalidade, isto é, os sínodos das Igrejas católicas orientais, os conselhos e assembleias das Igrejas sui iuris e as conferências episcopais, com suas expressões nacionais, regionais e continentais”.

Esta é a primeira vez, na história dessa instituição querida por São Paulo VI – em resposta ao desejo dos padres conciliares de manter viva a experiência colegial do Concílio Vaticano II –, que um sínodo começa descentralizado nas Igrejas particulares.

Em outubro de 2015, o papa Francisco, comemorando o quinquagésimo aniversário dessa instituição, expressou o desejo de um caminho comum de “leigos, pastores e bispo de Roma”, por meio do “fortalecimento da assembleia dos bispos e de uma descentralização salutar”. Aquele desejo agora se torna realidade.

3. SÍNODO: COMUNHÃO, PARTICIPAÇÃO E MISSÃO

“As palavras-chave do Sínodo são: comunhão, participação, missão. Comunhão e missão são expressões teológicas que designam – e é bom recordá-lo – o mistério da Igreja. O Concílio Vaticano II esclareceu que a comunhão exprime a própria natureza da Igreja e, ao mesmo tempo, afirmou que a Igreja recebeu ‘a missão de anunciar e instaurar o Reino de Cristo e de Deus em todos os povos e constitui o germe e o princípio deste mesmo Reino na terra’ (LG 5). E aqui temos a terceira palavra: participação. Comunhão e missão correm o risco de permanecer termos meio abstratos, se não se cultiva uma prática eclesial que se exprima em ações concretas de sinodalidade em cada etapa do caminho e da atividade, promovendo o efetivo envolvimento de todos e cada um” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

A palavra “sínodo” significa, justamente, “caminhar juntos”, e este é o intuito desse evento: todo o povo de Deus pôr-se à escuta junto com seus pastores. Todos os fiéis são convidados a participar deste tempo de comunhão de toda a Igreja. Esse encontro é um momento em que todo o povo pode pensar e rezar junto sobre os caminhos que a Igreja irá trilhar nos próximos anos.

“Não podemos deixar de falar sobre o que vimos e ouvimos” (At 4,20). É um convite a cada um de nós para tornar conhecido o que temos no coração. Essa missão é e sempre foi a identidade da Igreja: “Ela existe para evangelizar” (Paulo VI, EN 14). Nossa vida de fé enfraquece, perde a profecia, o encantamento e a gratidão quando ficamos isolados em nós mesmos ou em pequenos grupos.

Por sua própria natureza, a vida de fé exige crescente abertura, capaz de alcançar e abraçar a todos. Por isso, “mesmo os mais frágeis, limitados e feridos podem ser missionários à sua maneira, porque sempre devemos permitir que o bem seja comunicado, embora coexista com muitas fragilidades” (Francisco, Christus Vivit, n. 239).

4. O SÍNODO E A COMUNHÃO

“Ao encerrar o Sínodo de 1985, vinte anos depois da conclusão da assembleia conciliar, também São João Paulo II quis reafirmar que a natureza da Igreja é a koinonia: dela brota a missão de ser sinal de união íntima da família humana com Deus. E acrescentou: ‘Convém sumamente que na Igreja se celebrem sínodos ordinários e, se for necessário, também extraordinários’, os quais, para dar fruto, devem ser bem preparados: ‘é preciso que nas Igrejas locais se trabalhe pela sua preparação com participação de todos’ (Discurso de encerramento da 2ª Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, 7/12/1985)” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

Um tema que faz parte de nosso testemunho eclesial e é de suma importância para nós, cristãos católicos, é o da comunhão. A comunhão exprime a própria natureza da Igreja e a faz contemplar e viver o mistério da vida trinitária, que é comunhão de pessoas.

A comunhão da Igreja é obra exclusiva de Deus. Não podemos produzir a comunhão, mas pedi-la e mantê-la. Todos aqueles que creem em Cristo, em qualquer lugar, em qualquer tempo, fazem parte da família de Deus e estão ligados ao corpo de Cristo pelo Espírito.

Só existe um corpo de Cristo, uma Igreja, um rebanho, um só povo de Deus. Todos aqueles que nasceram de novo e foram lavados no sangue do Cordeiro fazem parte dessa bem-aventurada família de Deus. A Igreja é um corpo em que cada membro precisa ter o mesmo sentir de Cristo. A Igreja é como um coro que deve cantar no mesmo tom.

Os cristãos não são competidores, mas cooperadores. Não são rivais, mas parceiros. Não estão lutando por causas pessoais, mas todos buscando a glória de Deus. Na Igreja de Deus não devem existir disputas políticas, brigas por cargos, ciúmes e invejas.

5. O SÍNODO E A PARTICIPAÇÃO

“Comunhão e missão correm o risco de permanecer termos meio abstratos, se não se cultiva uma práxis eclesial que se exprima em ações concretas de sinodalidade em cada etapa do caminho e da atividade, promovendo o efetivo envolvimento de todos e cada um. Naturalmente, celebrar um sínodo é sempre bom e importante, mas só é verdadeiramente fecundo se se tornar expressão viva do ser Igreja, de um agir caracterizado por verdadeira participação. E isso não por exigências de estilo, mas de fé. A participação é uma exigência da fé batismal” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

O Santo Padre nos recorda que o batismo é a fonte inicial da nossa vivência de fé e pertença à Igreja. Dele, nossa fonte de vida, deriva a igual dignidade dos filhos e filhas de Deus, embora na diferença de ministérios e carismas. Por isso, todos somos chamados a participar na vida da Igreja e na sua missão: “Se falta uma participação real de todo o povo de Deus, os discursos sobre a comunhão arriscam-se a não passar de pias intenções. Participarmos todos é compromisso eclesial irrenunciável! Para todos os batizados, esta é a carteira de identidade: o batismo”.

Pertencimento e participação são duas realidades que caminham juntas. Saber-nos pertencentes à família dos filhos e filhas de Deus, ingressando pela porta da fé que é o batismo, faz-nos cada dia mais participantes dos mistérios de Cristo na vivência da fé, da esperança e da caridade, na celebração litúrgica, na comunhão eclesial e na missão de passar pelo mundo fazendo o bem.

Em virtude do batismo, somos chamados a ser discípulos e missionários de Jesus Cristo. “Os fiéis leigos são os cristãos que estão incorporados a Cristo pelo batismo, que formam o povo de Deus e participam das funções de Cristo: sacerdote, profeta e rei. Realizam, segundo sua condição, a missão de todo o povo cristão na Igreja e no mundo. São homens da Igreja no coração do mundo, e homens do mundo no coração da Igreja” (Documento de Aparecida, n. 209).

6. O SÍNODO E A MISSÃO

“Através destas duas palavras (comunhão e missão), a Igreja contempla e imita a vida da Santíssima Trindade, mistério de comunhão ad intra e fonte de missão ad extra. Depois de um tempo de reflexões doutrinais, teológicas e pastorais que caracterizaram a recepção do Vaticano II, São Paulo VI quis condensar precisamente nestas duas palavras – comunhão e missão – ‘as linhas mestras, enunciadas pelo Concílio’. Com efeito, ao comemorar sua abertura, afirmou que as linhas gerais foram ‘a comunhão, ou seja, a coesão e a plenitude interior, na graça, na verdade e na colaboração […]; e a missão, ou seja, o compromisso apostólico para com o mundo contemporâneo’ (Ângelus, 11/10/1970), que não é proselitismo” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

A missão é única: sermos alegres anunciadores do Cristo, levando a Boa-nova. Sair, partir e nada levar, apenas a coragem e o amor no coração. “Portanto, ide! Eis que eu vos envio como cordeiros para o meio dos lobos. Não leveis bolsa, nem mochila de viagem, nem sandálias; e a ninguém saudeis longamente pelo caminho. Assim que entrardes numa casa, dizei em primeiro lugar: ‘A paz esteja nesta casa!’” (Lc 10,3-5).

O anseio da missão ressoa: “Onde há amor e caridade, Deus aí está”. Este é o núcleo da missão: levar o amor, não em palavras, mas em atos concretos. Somos chamados a sair de nosso conforto e partir despojadamente, indo ao encontro do outro, lá onde ele estiver, para atender às necessidades que tiver. As ações concretas dessa ação missionária se dão na evangelização dos povos, raças e línguas.

A missão sempre foi tema importante e central na história da Igreja, desde sua fundação até nossos dias – como bem nos recorda o papa Francisco nesta convocação sinodal. Somos chamados à missão de evangelizar com ardor, enfrentando os desafios dos obstáculos, que sempre podem ser superados.

7. PRIMEIRO RISCO NA CAMINHADA SINODAL: O FORMALISMO

“O Sínodo, ao mesmo tempo que nos proporciona grande oportunidade para a conversão pastoral, não está isento de alguns riscos. O primeiro é o risco do formalismo. Pode-se reduzir um Sínodo a um evento extraordinário, mas de fachada, precisamente como se alguém ficasse a olhar a bela fachada de uma igreja, sem nunca entrar nela. Pelo contrário, o Sínodo é um percurso de efetivo discernimento espiritual, que não empreendemos para dar bela imagem de nós mesmos, mas a fim de colaborar melhor para a obra de Deus na história. Assim, quando falamos de uma Igreja sinodal, não podemos contentar-nos com a forma, mas temos necessidade também de substância, instrumentos e estruturas que favoreçam o diálogo e a interação no povo de Deus, sobretudo entre sacerdotes e leigos” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

O termo “formalismo”, utilizado pelo papa Francisco para apontar um dos riscos na caminhada sinodal, deve ser entendido como o perigo de dar prevalência à forma sobre o conteúdo ou significado. Chamamos de formalismo a atitude de preocupar-se mais com o modo pelo qual algo deve ser apresentado do que com o que deve ser apresentado.

Vale lembrar que o papa não quer fomentar uma atitude de contraposição entre conteúdo e forma. Os dois são importantes! As diversas estruturas que fazem parte da organização da Igreja visam favorecer e tornar clara a realidade do mistério de comunhão que ela é. No entanto, essa comunhão é ameaçada constantemente pelas feridas que trazemos dentro de nós, as quais não apenas nos dilaceram interiormente, mas também tendem a dilacerar as diversas realidades sociais em que estamos inseridos: família, comunidade, sociedade, Igreja etc.

Assim, a Igreja compreende que precisa estar sempre em reforma; ou, dizendo de outro modo, sempre em caminho de conversão.

8. SEGUNDO RISCO NA CAMINHADA SINODAL: O INTELECTUALISMO

“Um segundo risco é o do intelectualismo (da abstração; a realidade vai para um lado e nós, com nossas reflexões, vamos para outro): transformar o Sínodo numa espécie de grupo de estudo, com intervenções cultas, mas alheias aos problemas da Igreja e aos males do mundo; uma espécie de ‘falar por falar’, onde se pensa de maneira superficial e mundana, acabando por cair nas habituais e estéreis classificações ideológicas e partidárias e alheando-se da realidade do santo povo de Deus, da vida concreta das comunidades espalhadas pelo mundo” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

A caminhada sinodal é, acima de tudo, uma caminhada de docilidade espiritual. Não constitui um exercício mecânico de coleta de dados ou uma série de reuniões e debates. A escuta sinodal tem em vista o discernimento, que nasce da vida de fé, comum a todo e qualquer batizado. Requer que aprendamos a arte do discernimento pessoal e comunitário e nos exercitemos nessa arte: escutando-nos uns aos outros, escutamos nossa tradição de fé e os sinais dos tempos, a fim de discernir o que Deus está dizendo a todos nós.

O papa Francisco caracteriza, no instrumento de trabalho do Sínodo, os dois objetivos inter-relacionados desse processo de escuta: “escuta de Deus, até ouvir com ele o grito do povo; escuta do povo, até respirar nele a vontade a que Deus nos chama”.

Enfrentamos desafios gigantescos atualmente, em todos os níveis. Com a graça do Espírito Santo, precisamos discernir como ser sal da terra e luz do mundo hoje. A caminhada sinodal apresenta-se como uma proposta que está no coração da compreensão do mistério da Igreja, e não simplesmente como uma busca de estratégias de ação para responder aos desafios deste tempo. Embora seja necessária a renovação pastoral missionária, o ponto de partida é sempre o mistério de Deus, que é comunhão de pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo.

9. TERCEIRO RISCO NA CAMINHADA SINODAL: O IMOBILISMO

“Por fim, pode haver a tentação do imobilismo: dado que ‘se fez sempre assim’ (EG 33) – esta afirmação ‘fez-se sempre assim’ é um veneno na vida da Igreja –, é melhor não mudar. Quem se move nesse horizonte, mesmo sem se dar conta, cai no erro de não levar a sério o tempo em que vivemos. O risco é que, no fim, se adotem soluções velhas para problemas novos: um remendo de pano cru, que acaba por criar um rasgão ainda maior (cf. Mt 9,16). Por isso, é importante que o caminho sinodal seja verdadeiramente tal, que seja um processo em desenvolvimento; envolva, em diferentes fases e a partir da base, as Igrejas locais, num trabalho apaixonado e encarnado, que imprima um estilo de comunhão e participação orientado para a missão” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

A caminhada sinodal fundamenta-se em Cristo e segue a orientação do Espírito Santo. A escuta, a reflexão e a ação ajudam a construir comunidades florescentes e resilientes para a missão da Igreja hoje. Esse caminho exige movimento, ir adiante, requer nosso envolvimento humano de forma simples: rezar, refletir, prestar atenção na disposição interior, escutar e falar uns com os outros de maneira autêntica, significativa e acolhedora.

A escolha de uma caminhada sinodal constitui um sinal profético para a família humana, que tem necessidade de um projeto comum, apto a perseguir o bem de todos. Uma Igreja capaz de comunhão e de fraternidade, de participação e de subsidiariedade, em fidelidade ao que anuncia, poderá pôr-se ao lado dos pobres e dos últimos, emprestando-lhes a própria voz.

A Igreja vem enfrentando dolorosos desafios internos e externos. Contudo, é precisamente no enfrentamento desses sulcos cavados pelo sofrimento que novos caminhos florescem para refundar o caminho da vida cristã e eclesial.

10. UM TEMPO DE GRAÇA PARA UMA IGREJA SINODAL

“Vivamos, pois, esta ocasião de encontro, escuta e reflexão como um tempo de graça que nos ofereça, na alegria do Evangelho, pelo menos três oportunidades. Sempre voltamos ao estilo de Deus: o estilo de Deus é proximidade, compaixão e ternura. Deus sempre agiu assim. Se não chegarmos a esta Igreja da proximidade com atitudes de compaixão e ternura, não seremos Igreja do Senhor. E isso não só em palavras, mas com a presença, de tal modo que se estabeleçam maiores laços de amizade com a sociedade e o mundo: uma Igreja que não se alheie da vida, mas cuide das fragilidades e pobrezas do nosso tempo, curando as feridas e sarando os corações dilacerados com o bálsamo de Deus. Não esqueçamos o estilo de Deus que nos deve ajudar: proximidade, compaixão e ternura” (papa Francisco, Discurso de abertura do Sínodo, 9/10/2021).

A sinodalidade fala daquilo que, de maneira misteriosa, o sacramento do batismo realizou em nós. Fomos unidos a Cristo de forma tão radical, que somos seu corpo. O batismo é a porta e o fundamento da comunhão na Igreja, e a Eucaristia é a fonte e o ápice de toda a vida cristã (LG 11). O Sínodo é uma ferramenta que se nos oferece para que partilhemos ainda mais a riqueza que cada um possui em vista da missão.

A sinodalidade implica receptividade à mudança, formação e aprendizagem permanente. Nossa comunidade eclesial forma pessoas mais capazes de caminhar juntas, de se ouvirem umas às outras, de participar na missão e de se empenharem no diálogo? Que formação é dada para fomentar o discernimento e o exercício da autoridade de forma sinodal?

Com certeza o Espírito nos guiará e concederá a graça de avançarmos em conjunto, de nos ouvirmos mutuamente e iniciarmos um discernimento no nosso tempo, tornando-nos solidários com as fadigas e os anseios da humanidade.

Orani João Tempesta, O. Cist.*

é cardeal arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro.