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Publicado em maio-junho de 2021 - ano 62 - número 339 - pág.: 16-23

Solidariedade: considerações à luz da encíclica Fratelli Tutti, do papa Francisco

Por Claudiano Avelino dos Santos

“Tudo já foi dito uma vez, mas, como ninguém escuta, é preciso dizer de novo”
(André Gide)

O artigo destaca elementos da encíclica Fratelli Tutti, tendo por base algumas perguntas: Por que o papa se dedica ao tema da política? O que fazer para que a amizade social e a fraternidade universal não se restrinjam ao mundo das boas ideias, mas tenham incidência em nossas comunidades? A configuração com Jesus Cristo é indicada como essencial para iniciar o caminho da fraternidade universal, ou seja, de uma política diferente.

A encíclica Fratelli Tutti (“Todos irmãos”), publicada no dia de São Francisco de Assis do ano de 2020, foi um presente que o papa ofereceu não só à Igreja, mas também ao mundo. É um texto propositivo, que reúne reflexões a respeito da amizade e da fraternidade Social (FT 5) e faz aflorar à superfície do cotidiano a profundidade da Doutrina Social da Igreja, cuja base é o Evangelho, a prática de Jesus Cristo.

1. É preciso insistir na política

Compartilho uma reflexão baseada principalmente nos cinco primeiros capítulos da encíclica, destacando a necessidade da educação para a solidariedade:

A tarefa educativa, o desenvolvimento de hábitos solidários, a capacidade de pensar a vida humana de forma mais integral, a profundidade espiritual são realidades necessárias para dar qualidade às relações humanas, de tal modo que seja a própria sociedade a reagir diante das próprias injustiças, das aberrações, dos abusos dos poderes econômicos, tecnológicos, políticos e midiáticos (FT 167).

Esse trecho integra o capítulo quinto da Fratelli Tutti, no qual o papa reflete acerca da política. Como “política” é uma daquelas palavras desgastadas, desacreditadas, o santo padre deixa bem claro de que tipo de política está falando: da melhor política, aquela que está verdadeiramente a serviço do bem comum (FT 154). Já não é de agora que, olhando o mundo político que nos circunda, muitos de nós sentem aversão, repulsa, desinteresse, pois são inúmeras as denúncias de corrupção contra políticos, não importando o partido ou se é de esquerda ou de direita. Não obstante, o mau uso de qualquer coisa não significa que essa coisa, em si mesma, seja má. O mau uso que boa parte dos líderes políticos fazem da administração pública não deve ser motivo para desistir da busca pelo bem comum. É o que o papa Francisco nos ensina, ao dedicar um capítulo inteiro à política, a fim de lembrar a importância do tema para todos, especialmente para as pessoas de fé.

Por que o papa se preocupa com a educação para a solidariedade? E por que se dedica ao tema da política? A resposta poderia ser dada de maneira rápida: porque a política é um ato de caridade.

Alguém ajuda um idoso a atravessar um rio e isso é caridade primorosa; mas se o político lhe constrói uma ponte, isso também é caridade. É caridade se alguém ajuda uma pessoa fornecendo-lhe comida, mas se o político lhe cria um emprego, exerce uma forma sublime de caridade, que enobrece a ação política (FT 186).

2. O bom samaritano: modelo de cidadania e fraternidade universal

Para chegar a tratar de política e de solidariedade, Francisco, no primeiro capítulo da encíclica, descreve a situação do mundo atual com muita preocupação, pois tem a impressão de que a humanidade não está melhorando, como seria de esperar. Com tom profético de chamada de atenção, fala das tendências atuais que atrapalham o desenvolvimento da fraternidade universal, pontuando que “a história dá sinais de regressão. Reacendem-se conflitos anacrônicos, que se consideravam superados, ressurgem nacionalismos fechados, exacerbados, ressentidos e agressivos” (FT 11). A lista de sombras do nosso tempo é mesmo assustadora: ausência de consciência histórica, falta de projeto para todos, direitos humanos restritos, globalização sem rumo, ilusão de comunicação, informação sem sabedoria… Em um mundo assim, “[…] esmorecem os sentimentos de pertença à mesma humanidade; e o sonho de construirmos juntos a justiça e a paz parece uma utopia de outros tempos […]” (FT 30). Ou seja, vivemos um clima de cada um por si e todos contra todos.

Francisco observa o cenário mundial e procura encontrar caminhos alicerçados na fé cristã, os quais podem ser de proveito a todas as pessoas. “Deus continua a espalhar sementes de bem na humanidade” (FT 54). Essa certeza abre espaço para a caridade efetiva, da qual o bom samaritano (Lc 10,23-57) é exemplo contundente, capaz de interpelar qualquer pessoa, independentemente das convicções religiosas (FT 56).

De fato, essa parábola, sobre a qual o papa se debruça no segundo capítulo da encíclica, mostra, de maneira clara, como “amar o outro e cuidar dele” (FT 59), não importando de onde ele venha (FT 62). Infelizmente, contudo, a tendência da sociedade atual vai na direção oposta da atitude de amor e cuidado do bom samaritano: “[…] como estamos todos muito concentrados em nossas necessidades, ver alguém que está mal incomoda-nos, perturba-nos, porque não queremos perder tempo por culpa dos problemas alheios […]” (FT 65).

Somos educados para fazer sucesso, empreender, o que em si mesmo não é um mal. O problema é que a educação para a realização pessoal, em geral, não ajuda a olhar para a outra pessoa como um irmão, mas sim, muitas vezes, como um empecilho, um concorrente e, na melhor das hipóteses, como alguém de quem se pode tirar algum benefício.

Qual é a saída? O papa sabe, todos sabemos, que não é fácil encontrá-la. Por isso, o bom samaritano, personagem da parábola contada por Jesus, é tomado como ponto de partida para uma reflexão cujo objetivo é levar a ressurgir a vocação de cidadãos do próprio país e do mundo inteiro, construtores de novo vínculo social, no qual viver indiferente à dor do outro não é opção (FT 66; 68).

O sonho do papa de amizade social, de fraternidade universal, seguindo o Evangelho, visa ao mundo inteiro, à sociedade. Entretanto, é um engano pensar que a transformação social se dá sem mudança pessoal. Por isso, Francisco apresenta os personagens da parábola de modo a levar o leitor a um exame de consciência: diante do outro que está ferido, identificamo-nos com aqueles que passam adiante ou com quem cuida? (FT 70).

É chocante constatar que são justamente o sacerdote e o levita – ou seja, pessoas ligadas ao serviço religioso – os que não se importam com a pessoa ferida à beira do caminho. Do ponto de vista de sua religião, eles parecem corretos, pois, se tocassem em um cadáver, ficariam impuros e não poderiam cumprir seu ofício. Entretanto, a parábola chama a atenção para o fato de que, mesmo que as práticas religiosas sejam importantes, elas não podem se desvincular do cuidado do outro, especialmente de quem está ferido. Viver a fé como amor ao próximo, por amor a Deus, é exigente.

Quando a religiosidade segue a mesma lógica da busca de prosperidade a qualquer custo, as pessoas feridas, nas diversas situações de periferia, são vistas como exemplo de fracasso e gente a ser evitada. A fé em Deus, que é Pai, criador de todos, não nos autoriza tais atitudes individualistas, de quem pensa no sucesso individual sem levar em conta o outro. Nesse sentido, diz o papa, é escandaloso que, em nome da religião, pessoas se sintam autorizadas a atitudes de xenofobia, desprezo e maus-tratos para com quem é diferente (FT 86).

3. A hospitalidade: acolher a vida indefesa e espoliada

Tendo apresentado a parábola do bom samaritano como iluminação para as situações sombrias de nosso tempo, Francisco, no capítulo terceiro, reflete sobre as possibilidades de pensar e gerar um mundo aberto, no qual as pessoas ou povos não estejam fechados sobre os próprios interesses, encerrados nas próprias fronteiras, sem se importarem com a situação do outro. O ponto de partida para a busca desse mundo é o fato de que o ser humano só se realiza se doando aos outros, ou seja, amando, relacionando-se (FT 87).

Como expressão concreta de amor que não se deixa cair na armadilha do egoísmo autorreferencial, o papa apresenta a hospitalidade (FT 90), praticada, entre outros, pelos mosteiros. De fato, a Regra de São Bento manda que os enfermos, as crianças, os hóspedes e os pobres sejam tratados com toda solicitude, pois Deus pedirá conta do cuidado dispensado a esses necessitados. O peregrino que pede hospedagem, na verdade, deveria ser tratado como o próprio Cristo (Regra de São Bento, cap. 51-53). Esse exemplo é bastante eloquente, pois, como sabemos, a vida religiosa contemplativa tem máximo apreço pela oração, pela meditação, por certa rotina de estudo e silêncio. Não obstante, cuidar de alguém que bate à porta da comunidade religiosa não é visto como algo contrário à contemplação, mas ocasião de pôr em prática o que se reza, o que se celebra, o que se estuda.

O amor fraterno, vivenciado em comunidade, em uma sociedade local, é a base da fraternidade que se estende a todos. O amor amplo, expansivo, é a base da “amizade social”, que, a partir de uma sociedade concreta, abre-se a todos (FT 100). A busca do papa baseia-se na superação das relações interesseiras, nas quais se procura ter “sócios”, e não fazer “irmãos” (FT 103-105). Ter sócio ou fazer parte de uma sociedade não é pecado. Entretanto, o Evangelho de Jesus nos impele a ampliar, o máximo possível, um modo de relacionamento não fundado no interesse. Na ótica de Jesus Cristo, é legítimo desfazer uma sociedade, ou seja, por razões práticas alguém deixar de ser sócio de outra pessoa, mas jamais o outro deve deixar de ser considerado irmão simplesmente porque não atende aos meus interesses ou porque não pensa como eu.

Para que se caminhe rumo à amizade social e à fraternidade universal, é imprescindível reconhecer o valor do ser humano, que merece respeito e dignidade pelo simples fato de existir, em qualquer circunstância (FT 106-108). A dignidade inegociável do ser humano não pode se sujeitar aos critérios de liberdade de mercado e eficiência (FT 109-110). Os direitos inalienáveis da pessoa humana não podem ser confundidos com direitos individualistas, cada vez mais reivindicados, sem levar em conta o bem maior, o amadurecimento integral humano, baseado na benevolência, isto é, no “querer bem” ao outro (FT 112-113).

Direitos individualistas, requisitados como humanos, estão na base de tantas atitudes mesquinhas – por exemplo, de quem quer tirar os pobres das ruas a qualquer custo, como medida de “higiene” e como se as pessoas humanas pudessem ser consideradas lixo, ou de quem defende como direito o aborto, sem considerar a vida em desenvolvimento. Quanto vale uma vida de poucos dias no ventre da mãe? Quanto vale a vida de uma pessoa caída na calçada por fome ou mesmo por embriaguez? Aos olhos de Deus, são infinitamente valiosas. Disso é preciso tirar consequências práticas, que incomodam quem põe o bem-estar individual como lei absoluta.

O Evangelho nos ensina que é preciso pensar e agir em termos de comunidade, priorizando a vida de todos acima da apropriação dos bens por parte de alguns (FT 114-116). Nesse sentido, a Doutrina Social da Igreja reconhece a importância da propriedade privada, como garantia da ordem social e incentivo à produção, desejando que o máximo de pessoas sejam proprietárias. Entretanto, não se trata de um valor absoluto e intocável,  pois está subordinado ao direito de uso comum dos bens criados por Deus.

Segundo o papa, é preciso retornar ao tema da função social da propriedade, uma vez que o uso dos bens criados deve ordenar-se para a realização integral de todas as pessoas (FT 118-120), independentemente de onde tenham nascido (FT 121). O papa reconhece que esse modo de pensar, essa lógica, só faz sentido tendo por base a dignidade que a pessoa humana possui pelo simples fato de existir (FT 127).

Depois de propor o ideal de que todos são irmãos e irmãs pelo simples fato de serem humanos, para que tal se concretize, no quarto capítulo o papa Francisco discorre a respeito de “desafios que nos fazem mover, nos obrigam a assumir novas perspectivas e produzir novas reações” (FT 128). Destaca-se, em primeiro lugar, o desafio das fronteiras e o problema da migração, que deveria ser enfrentado com a ampliação do conceito de cidadania, baseando-o na igualdade dos direitos e deveres, sem se prestar a usos discriminatórios (FT 129-132). Os migrantes precisam ser acolhidos como dom, pois podem contribuir com os valores de sua cultura, ao mesmo tempo que acolhem os valores da cultura que os recebe (FT 133-136).

Para que haja desenvolvimento solidário de todos os povos, o papa pede um ordenamento jurídico, político e econômico mundial, de modo que todos possam se beneficiar do progresso de cada povo (FT 138). Embora reconheça o valor da colaboração mútua, ele adverte contra o risco do utilitarismo, que leva nações a só desejar receber pessoas cuja presença redunde em benefícios imediatos, como cientistas e investidores (FT 139-140). O remédio contra esse mal é a gratuidade, e Francisco profetiza: “Só poderá ter futuro uma cultura sociopolítica que inclua o acolhimento gratuito” (FT 141).

A abertura para a fraternidade universal, lembra Francisco, não se faz negando as realidades locais. Pelo contrário, para que o diálogo com o outro seja autêntico, é importante estar ancorado na própria cultura (FT 143-145), sem o exagero do narcisismo bairrista, consciente de que […] sem o relacionamento e o confronto com quem é diferente, torna-se difícil ter um conhecimento claro e completo de si mesmo e de sua terra, uma vez que as outras culturas não constituem inimigos de quem seja preciso defender-se, mas reflexos distintos da riqueza inexaurível da vida humana […] (FT 147).

Para chegar à desejada fraternidade universal, o papa realça a importância do intercâmbio entre os países de uma mesma região, tomando como paradigma o clima de ajuda mútua existente em bairros populares (FT 151-153).

Francisco apresenta o ideal da fraternidade universal, segundo a qual todos os seres humanos são irmãos e possuem dignidade simplesmente pelo fato de existirem. Essa dignidade é mais importante que a origem, a crença, a posse de riquezas… Entretanto, o mundo atual parece dar passos na direção contrária: ressurgimento e cultivo de toda espécie de ódio, a justa luta pelos direitos humanos sendo substituída pela busca de garantia de privilégios egoístas e assim por diante. Como fazer que se diminua a distância entre um ideal tão bonito e um cenário tão assustador? A política, inevitavelmente, aparece como instrumento de organização, de engajamento das pessoas no empenho da amizade social e da fraternidade universal.

 4. A política como amor

Para que a fraternidade entre povos e nações se concretize, é preciso haver uma política a serviço do verdadeiro bem comum. Esse é o tema do capítulo quinto, intitulado “A melhor política”. Colocar o adjetivo “melhor” ao lado do substantivo “política” faz-se necessário, pois não é de agora que, no linguajar comum, política se tornou sinônimo de muita coisa que vai no sentido contrário de seu sentido primeiro, confundindo-se, por exemplo, com a capacidade de manipular as pessoas em função de interesses particulares.

Por isso que, antes de falar propriamente da melhor política, o papa, sob os nomes de “populismos” e “liberalismos”, agrupa os desvirtuamentos da política, que impedem o que ele chama de “mundo diferente” (FT 154). O populismo é a degradação da noção de povo, que é benéfica, pois congrega, dá identidade, noção de pertença, e faz de um agrupamento humano mais do que a soma dos seus indivíduos (FT 156-158). O populismo se dá quando a cultura do povo é instrumentalizada, política ou economicamente, por um líder que não visa conseguir que a organização da sociedade assegure trabalho a todos, ou seja, que a cada pessoa se garanta uma maneira de contribuir com as próprias capacidades e o próprio esforço (FT 159-162).

Após insistir na necessidade de não dissociar a dignidade pessoal de vínculos comunitários, o papa aponta os limites das visões liberais individualistas, que enfatizam as liberdades individuais sem se preocupar com a situação dos mais frágeis da sociedade. A polarização entre povo e indivíduo, entre público e privado, promovida por esse tipo de visão é desnecessária, pois “o amor ao próximo realista […] nada desperdiça do necessário a uma transformação da história que beneficie os últimos” (FT 165).

Não há dúvida de que a política requeira inteligência, capacidade de planejamento, agilidade, senso de oportunidade e tantas outras características ligadas à organização. Sem isso, a caridade pode ficar apenas no campo dos ideais que nunca se concretizam. A frieza técnica, porém, não dá conta de tudo. Por isso, para fazer a melhor política, desejada pelo papa, é preciso ter, tanto por pressuposto como por finalidade, o amor incondicional ao ser humano em virtude da dignidade que possui pelo simples fato de existir.

É preciso subordinar toda a técnica política à dignidade humana, o que não se alcança de modo espontâneo, mas requer muito esforço. O primeiro esforço a ser feito é o da conversão do coração. O papa apela à necessidade da conversão do coração, evocando um termo clássico para a teologia cristã, a concupiscência, “inclinação do ser humano a fechar-se na imanência do próprio eu, do seu grupo, dos seus interesses mesquinhos” (FT 166), que marca o homem e a mulher desde sempre.

À luz dessa observação do papa, fica claro que, para chegar, o máximo possível, mais próximo da amizade social e da fraternidade universal, não bastam decretos ou projetos estruturais. A transformação de cada pessoa – que precisa se observar, fazer exame constante de seus atos – é fundamental. Assim, uma lei não trará para uma nação e para o mundo mais fraternidade se cada pessoa não se puser em perspectiva amorosa e fraterna desde os pequenos gestos. As reivindicações políticas pelas grandes causas precisam estar em consonância com os pequenos gestos.

 1. A educação para hábitos solidários

O amor político é exigente, como também o é o amor por uma pessoa ou pela família. Há no coração humano a inclinação para o amor, mas no mesmo coração surgem tantas outras tendências. É preciso identificá-la e, de forma semelhante ao que se faz com uma planta benéfica numa horta ou num jardim, cultivá-la para que cresça, floresça, frutifique. O amor que floresce ou frutifica desdobra-se em atos de cuidado, de solidariedade, de interesse por compreender o outro, tendo como marca a gratuidade. Essas palavras não deixam de passar certo ar de ingenuidade, de utopia inalcançável, pois os discursos e, sobretudo, as atitudes mais comuns são aquelas devotadas ao individualismo.

O papa Francisco parece estar conclamando os católicos e todas as pessoas de boa vontade a movimentar-se na contramão da sociedade, que põe a produtividade como critério de tudo, também para qualificar a pessoa. Em poucas palavras, educa-se para o mercado, e não para a solidariedade. O mercado tende a se movimentar apenas baseado nos interesses de satisfação das necessidades das pessoas mais abastadas. No modo mercadológico de pensar e agir, ficam de fora atitudes como gratuidade e solidariedade com os mais fracos, os pobres, os da periferia. Outro modo de fazer as coisas precisa ser experimentado, com ousadia. Outro caminho precisa ser trilhado.

O papa quer, com sua encíclica, fazer renascer novo sonho de fraternidade e amizade social, mas quer que a resposta a isso não sejam apenas palavras (cf. n. 6). Entre as indicações que deixou, uma deve tocar, de modo contundente, nossa atividade pastoral: “[…] é importante que a catequese e a pregação incluam, de forma mais direta e clara, o sentido social da existência, a dimensão fraterna da espiritualidade, a convicção sobre a dignidade inalienável de cada pessoa e as motivações para amar e acolher a todos” (FT 86).

Fica, agora, às lideranças católicas a tarefa de serem os primeiros a concretizar a palavra do papa e, em todas as atividades, dos planos de pastoral às pregações, motivar atitudes de fraternidade, de acolhida, de amizade social. Não nos iludamos, porém: sem configuração com Jesus Cristo, sem espiritualidade profunda, sem a força que brota da oração, sobretudo da Eucaristia, não conseguiremos fazer uma política diferente da que está aí. Só conseguiremos, na melhor das hipóteses, sociedade, jamais fraternidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PAPA FRANCISCO. Fratelli Tutti: Carta Encíclica sobre a fraternidade e a amizade social. São Paulo: Paulus, 2020.

PONTIFÍCIO CONSELHO JUSTIÇA E PAZ. Compêndio da Doutrina Social da Igreja. São Paulo: Paulinas, 2011.

SÃO BENTO. Regra do glorioso patriarca São Bento. Disponível em: <www.movimentopax.org.br/saoBento/Regra%20de%20Sao%20Bento.pdf>. Acesso em: 30 out. 2020.

Claudiano Avelino dos Santos

é superior dos Padres e Irmãos Paulinos, doutor em Filosofia pela Universidade Federal de São Paulo.