Carta do editor

março-abril de 2012

Caros leitores e leitoras,

Neste ano de 2012, a Igreja, por meio da Campanha da Fraternidade, convida-nos a refletir sobre a questão da saúde pública no Brasil.

Como sabemos por meio dos evangelhos, Jesus dedicou grande atenção aos doentes, libertando-os de seus males. Nos evangelhos e em toda a Bíblia também encontramos forte preocupação com a promoção da saúde em sentido amplo: promoção da justiça, da paz, dos direitos etc. Segundo definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), saúde não é apenas ausência de doenças, mas completo bem-estar físico mental e social. Na Bíblia, a palavra hebraica que melhor expressa o sentido de “saúde” é shalom, que remete ao pleno bem-estar e envolve possibilidade de trabalho e vida digna, paz, fraternidade, justiça etc.

O objetivo da CF-2012 é promover ampla discussão sobre a realidade da saúde no país, para contribuir na qualificação, no fortalecimento e na consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS), em vista da melhoria da qualidade dos serviços, do acesso e da vida da população.

O SUS, com todas as suas dificuldades e imperfeições, foi uma conquista da Constituição de 1988, no sentido de garantir o acesso universal e gratuito a toda a população. Embora esse ideal ainda não tenha sido alcançado com qualidade, tem havido um avanço gradual, que precisa ser acelerado, para que se superem os graves problemas existentes. Mesmo com tais problemas e as muitas carências, o sistema tem conseguido resultados importantes, como poderemos constatar nos artigos desta edição.

O aperfeiçoamento do serviço passa por melhor controle dos recursos, muitas vezes sugados pela corrupção e pela má gestão em todos os níveis, o que envolve não apenas os políticos, mas também empresários e mesmo servidores públicos. Tal controle cabe não só ao governo, mas também à sociedade, por meio dos conselhos de saúde, dos movimentos sociais, assim como da participação consciente e criteriosa nas eleições e da cobrança aos políticos. Também se faz necessário o aumento dos recursos destinados à área da saúde. Embora a corrupção e a má gestão retirem parte desses recursos, é falácia dizer que esse é o único problema. É consenso entre quem conhece bem a área que o sistema de saúde está subfinanciado.

A imprensa, que muitas vezes faz certa “festa” sensacionalista em torno do caos na saúde – quando se trata de governantes que não são seus aliados –, além de não aprofundar a questão, espalha a ideologia, de interesse dos mais ricos, segundo a qual a carga tributária no Brasil é muito alta e, portanto, não se podem criar novas fontes de recursos para a saúde pública. Na verdade, há um desequilíbrio na carga tributária do país, pois ela recai mais sobre os pobres e a classe média e menos sobre os mais ricos, o que não ocorre em países onde há maior equilíbrio nos tributos. Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) demonstram que, como os impostos brasileiros incidem mais sobre os produtos que sobre a renda, os pobres pagam, por exemplo, proporcionalmente três vezes mais ICMS que os ricos. A incidência percentual de Imposto de Renda é a mesma para quem ganha R$ 3,7 mil ou R$ 370 mil por mês. Segundo o presidente da CUT, Arthur Henriques, em recente artigo, cobrando 1,5% de  alíquota média anual sobre patrimônios que ultrapassassem 8.000 salários mínimos o país teria 30 bilhões de reais por ano para a saúde. Dinheiro considerado suficiente para darmos um salto de qualidade na área. Enquanto as grandes fortunas gozam de um sistema tributário que sustenta as desigualdades e injustiças sociais do país historicamente, metade da população vive co menos de um slário mínomo por mês. Por que não se cria um imposto sobre grandes fortunas para financiar a saúde pública, em vez de um imposto que recaia sobre todos igualmente? Infelizmente a desigualdade social no país não será modificada significamente enquanto a população continuar elegendo maioria de deputados, senadores, vereadores e governantes que defendem os interesses dos mais ricos em detrimento das necessidades das classes economicamente mais pobres. Difundir a saúde sobre o país e sobre a terra passa também pela redução das injustiças e desigualdades sociais.

Pe. JaksonFerreirade Alencar, ssp

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