Carta do editor

novembro-dezembro de 2011

GraçaePaz!

“Quem não se comunica se trumbica, fica na saudade”, dizia, em tom de brincadeira, um popular apresentador de televisão de anos atrás. A frase tem boa dose de sentido. A comunicação eficaz permite o desenvolvimento, a criação de interações fecundas, a realização de metas e objetivos.

            O conteúdo desta edição de Vida Pastoral tem essa temática de fundo. Estamos vendo há algumas edições o tema “pastoral em novas perspectivas”, tratando sobretudo das mudanças de cosmovisões ao longo da história e suas implicações para a pastoral. Da cosmovisão teocêntrica passou-se para a antropocêntrica, e atualmente se desenvolve nova cosmovisão, a ecológica. Todas essas mudanças e avanços foram se dando em processos históricos de comunicação, no sentido amplo da ideia de comunicação: interações, discussões, diálogos, trocas de conhecimentos, sentimentos… Vemos, nas diversas épocas, que grupos sociais que não interagem com as novas visões de mundo ficam “na saudade” do passado, tentando mantê-lo ou resgatá-lo.

            Essas mudanças de cosmovisões não dizem respeito somente a conteúdos, mas envolvem profundamente o ser humano, sua espiritualidade, aquilo que o move interiormente. Elas implicam mudanças também da espiritualidade especificamente religiosa.

            Na visão de mundo teocêntrica, predominava uma espiritualidade de fidelidade à doutrina, espiritualidade que se elaborou na síntese entre teologia e filosofia grega. Na mudança para a visão antropológica, ganha força a espiritualidade mais subjetiva: tem-se não apenas fé em um conjunto de verdades, mas também uma interpretação pessoal delas. Em seu artigo, Nicolau Bakker denomina essa nova espiritualidade de “fidelidade ao Espírito”. A dificuldade de diálogo e consenso no interior da Igreja a respeito dessa guinada levou partes significativas de seus membros a desenvolver a Reforma Protestante. Mas o avanço dessa nova espiritualidade também estimulou o papa João XXIII a sonhar com uma Igreja inteiramente renovada, o que se procurou realizar no Concílio Vaticano II, cujos 50 anos de convocação celebramos no dia 25 de dezembro.

            Sem dúvida, a fidelidade à doutrina está no cerne da tradição judaico-cristã e, particularmente, da Igreja Católica. Mas doutrina não quer dizer interpretações fixas, repetitivas e imutáveis para sempre. A compreensão da Revelação divina dessa maneira tende a levar à busca da manutenção de sentidos por meio de atitudes impositivas e conteúdos universais obrigatórios a serem decorados, e não por meio de diálogo, interação e comunicação com novas realidades, com as quais sua interpretação pode enriquecer-se.

            A nova cosmovisão ecológica traz consigo a espiritualidade da ética humanitária e ecoplanetária, da valorização do todo do planeta e não apenas da razão; espiritualidade da cooperação e da teia de relações vitais. É salutar manter a identidade cristã e católica, mas sabendo desenvolver respeito e diálogo com todas as teologias e com as diferentes tradições, incluindo as do passado e a Tradição da Igreja, que são a base na qual nos movemos. Essa forma de interação implica a aceitação de que tudo está sempre em movimento e em busca de novo equilíbrio. Do diálogo e da interação saímos sempre renovados e enriquecidos.

Pe. JaksonFerreirade Alencar, ssp

Editor