Roteiros homiléticos

Publicado em novembro-dezembro de 2023 - ano 64 - número 354 - pp.: 40-42

12 de novembro – 32º DOMINGO DO TEMPO COMUM

Por Izabel Patuzzo*

Vigiai e estai preparados!

I. INTRODUÇÃO GERAL

Em sintonia com a proximidade da conclusão do ano litúrgico, as leituras deste domingo nos convidam à vigilância. O tema da segunda vinda do Senhor, que perpassa as leituras, ressalta a importância de caminharmos sempre atentos às manifestações de Deus em nossa vida.

A primeira leitura nos apresenta o dom da sabedoria divina, concedida ao ser humano como manifestação da gratuidade de Deus. O Criador não guarda sua sabedoria para si, mas a compartilha com o ser humano, a fim de iluminar sua vida e conduzi-lo ao caminho da felicidade. Na segunda leitura, Paulo dirige-se à comunidade dos cristãos de Tessalônica, assegurando que Cristo virá uma segunda vez para concluir sua obra redentora e inaugurar a última e definitiva etapa da história da salvação. Aqueles que permanecerem fiéis à fé cristã irão experimentar esse encontro definitivo com Ele. O Evangelho nos recorda que somos convidados a estar sempre preparados para a vinda do Senhor. O discípulo de Jesus é vigilante em sua fé, por isso está atento às manifestações de Deus em sua vida.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. I leitura (Sb 6,12-16)

O livro da Sabedoria pertence ao gênero da literatura sapiencial do Antigo Testamento, a qual forma a última parte dos escritos veterotestamentários.  A literatura sapiencial reinterpreta a Lei mosaica com a sabedoria da longa tradição do povo de Deus, que aprendeu a tomar lições da história. Esse livro nasce das comunidades dos fiéis em situação de diáspora, convivendo com outras culturas. O contato com outros povos, por um lado, ampliou a sabedoria, o conhecimento do povo judeu, mas também, por outro, os alertou sobre o perigo da idolatria, dos costumes que poderiam pôr em risco sua identidade de povo escolhido, chamado a caminhar sob as diretivas da Lei de Deus.

O texto proposto para a liturgia deste domingo pertence à segunda parte do livro da Sabedoria, atribuindo a Salomão um elogio à sabedoria. Evidentemente, na época em que o livro foi composto, por volta do século I a.C., o reinado de Salomão já era conservado apenas na memória, por vários séculos. A sabedoria desse rei foi apenas superficial, pois se deixou levar pela idolatria e se distanciou da Lei de Deus. Por isso, o autor do livro da Sabedoria faz um convite à comunidade dos fiéis a tirar lições da história e buscar a arte do bem viver. A sabedoria, na visão bíblica, consiste em adotar um conjunto de princípios práticos, uma conduta ético-moral deduzida da longa experiência como povo consagrado a Deus. Os Mandamentos precisaram ser atualizados e ampliados em um conjunto de leis que respondessem aos novos desafios, mas, em sua essência, tinham como objetivo proporcionar à comunidade dos fiéis uma vida ordenada, justa, equilibrada, garantindo o futuro de Israel. Para o povo escolhido, as diretivas divinas são a fonte de toda sabedoria. Portanto, é sábio todo aquele que põe em prática a Lei de Deus, enriquecida com a experiência de vida preservada na tradição.

 2. II leitura (1Ts 4,13-18)

Segundo os relatos apresentados no livro dos Atos dos Apóstolos, a permanência de Paulo em Tessalônica foi muito breve. Contudo, a comunidade local acolheu o anúncio da Boa Notícia com grande prontidão, respondeu com grande fervor e entusiasmo ao Evangelho pregado por Paulo. Por isso, o apóstolo acompanha o crescimento espiritual dos cristãos de Tessalônica com grande preocupação. Sentindo a necessidade de um aprofundamento catequético, sobretudo porque foram postos à prova pela sinagoga dos judeus, Paulo envia Timóteo para assistir pastoralmente os tessalonicenses.

Uma questão teológica que deixou muitas dúvidas nos cristãos da comunidade dizia respeito à segunda vinda de Jesus Cristo, no fim dos tempos. Essa doutrina não havia sido bem compreendida na primeira pregação de Paulo. Alguns acreditavam que tal vinda era iminente, enquanto outros a concebiam como realidade de um futuro muito distante. Essa dúvida teve impacto na vida dos cristãos. Paulo exorta a comunidade a não se preocupar com o tempo da vinda do Senhor, e sim em viver uma vida segundo o Evangelho, pois essa é condição fundamental para alcançar a salvação.

3. Evangelho (Mt 25,1-13)

A parábola das dez virgens aparece no contexto dos últimos ensinamentos de Jesus aos discípulos antes de sua paixão, morte e ressurreição. O relato se insere no final da caminhada para Jerusalém, quando Jesus está prestes a entrar na cidade, pouco antes de seu julgamento. Todo o capítulo 25 de Mateus é chamado de o último discurso escatológico. A narrativa apresenta o juízo final na perspectiva teológica do evangelista e de sua comunidade. A atitude fundamental das personagens é a preparação para a vinda do Senhor.

O Evangelho segundo Mateus foi escrito depois dos meados do século I d.C. – portanto, quando os cristãos já não esperavam a vinda iminente do Senhor. A comunidade seguia despreocupada com uma possível segunda vinda de Jesus Cristo. Essa compreensão escatológica do fim dos tempos contribuiu para a instauração de um espírito de acomodação em muitos membros da comunidade. A parábola, então, chama a atenção dos fiéis, pois, embora ninguém saiba quando o Senhor virá, é preciso que cada um leve uma vida de compromisso, de vigilância, à espera do Senhor, como se ele pudesse vir a qualquer momento.

O evangelista Mateus faz verdadeira catequese com essa parábola, aludindo ao casamento, para recordar aos discípulos e discípulas a Nova Aliança selada com Jesus. Por isso, o relato apresenta um cenário de casamento, com rituais típicos dos costumes judaicos. Segundo a cultura judaica daquele tempo, a cerimônia começava com a preparação da noiva, que esperava a vinda do noivo para levá-la para a casa onde iriam habitar juntos. Esses preparativos envolviam as famílias de ambos os noivos, parentes e amigos. Desse modo, a preparação e o cumprimento dos papéis de cada um no cerimonial eram extremamente importantes. Mateus usa dessa metáfora para comparar como deve ser a preparação do(a) discípulo(a) para o encontro definitivo com o Senhor. Esse encontro deve ser bem preparado, para se realizar na alegria, como a de um casamento. A comunidade fiel espera pelo encontro com o Senhor com muita expectativa, com ansiedade pela chegada do Messias. As virgens imprudentes representam aquelas pessoas cuja fé e compromisso esmoreceram, que perderam o entusiasmo, caíram no desânimo e já não têm vivacidade para o encontro pessoal com Jesus no cotidiano.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

Podemos nos interrogar: que sentido ainda tem essa parábola para nós, em nossa vivência comunitária atual? Nossa comunidade encontra-se em um contexto muito diferente do da comunidade de Mateus, mas também experimentamos momentos de envolvimento entusiasta e, às vezes, de desencantamento, sobretudo quando as dificuldades nos levam a perder a alegria e a inspiração para um engajamento mais pleno. As tribulações da caminhada, os atrativos de outras atividades fora da comunidade, as preocupações familiares e de trabalho podem nos afastar do caminho de um discipulado mais comprometido.

As leituras nos recordam que os discípulos e discípulas sábios são aqueles que vivem na esperança, como nos indica a segunda leitura. Atualizando a narrativa evangélica, são aqueles que dão valor a cada oportunidade de preparar bem o encontro definitivo com Deus, estabelecendo prioridades, fazendo tudo bem-feito, como as virgens que se preparam bem para a chegada do noivo e para a celebração da festa do encontro.

Izabel Patuzzo*

*pertence à Congregação Missionárias da Imaculada - PIME. Mestre em Aconselhamento Social pela South Australian University e em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é licenciada em Filosofia e Teologia pela Faculdade Nossa Senhora da Assunção. Doutoranda em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. em São Paulo. E-mail: [email protected]