Roteiros homiléticos

Publicado em julho-agosto de 2020 - ano 61 - número 334 - pág.: 45-47

15º DOMINGO DO TEMPO COMUM – 12 de julho

Por Ir. Rita Maria Gomes

A Palavra do Senhor gera frutos abundantes

I. Introdução geral

Na liturgia do domingo anterior, as leituras chamavam nossa atenção para a necessidade de reconhecimento e acolhimento do Messias rei, justo e humilde. Em todas as leituras, ficava patente a incapacidade de alguns de reconhecer a visita de Deus ao seu povo na pessoa de Jesus Cristo. A imagem que veicula a mensagem da liturgia deste domingo é, sobretudo, a da semeadura, que se encontra na primeira leitura e no Evangelho. A segunda leitura liga-se às outras não pela imagem da semeadura, mas pela menção aos frutos do Espírito. A imagem da segunda leitura, a do parto, traz a mesma ideia de espera que aparece na imagem do campo semeado. É a partir daí que precisamos pensar a mensagem central da liturgia deste dia e cantar com o salmista: “A semente caiu em terra boa e deu fruto” (Sl 64).

II. Comentários dos textos bíblicos

1. Evangelho (Mt 13,1-23)

A versão mateana da parábola da semeadura segue o esquema marcano, que, entre a parábola e a alegorização da parábola, intercala o motivo de falar ao povo por esse meio. O que está no centro é a razão de ser do texto e, de modo especial, de seu uso na liturgia deste domingo. O falar em parábolas está justificado pela citação do profeta Isaías, que diz: “ouvindo, não ouvem, vendo não veem e não entendem” (v. 13). Como na liturgia do domingo anterior, permanece a dificuldade em aceitar o enviado divino e seu projeto salvífico.

Quanto à parábola, temos uma imagem muito rica da semeadura, que só encontra seu real sentido na alegorização. Ali, entendemos que o ponto principal não é a semente nem o semeador, e sim o solo no qual cai a semente. A semente lançada é a Palavra, o ensinamento do Reino. Daí se entende que o semeador é o próprio Jesus. Os solos são quatro: o situado à beira do caminho, o solo pedregoso, o solo espinhoso e o solo bom. A cada um se explicita uma dificuldade para que a semente germinada dê frutos. Ao final, só o solo bom dá fruto. Mesmo este, porém, não tem paridade na quantidade de frutos que produz: um dá cem, outro sessenta e outro trinta. Isso guarda a diversidade entre aqueles “solos” bons que acolhem bem a Palavra e lhe permitem germinar e se fortalecer o suficiente para produzir frutos.

Assim, na imagem do Evangelho, o questionamento sobre o porquê de falar em parábolas recebe, de certo modo, sua resposta na alegorização. É necessário receber a Palavra, deixá-la germinar e esperar que produza os frutos. Não é suficiente ouvir com os ouvidos. É necessário experimentar o ensinamento de Jesus na profundidade do Espírito, assim como a semente afunda na terra para renascer.

2. I leitura (Is 55,10-11)

A leitura de Isaías acentua a imagem da chuva – essencial para fecundar a terra e fazer germinar e dar semente – como meio para falar da Palavra de Deus, que é performativa. O movimento da água, que, saindo do céu, não volta mais, mas tem um efeito positivo para a vida humana, é adequado para falar desse caráter efetivo da Palavra. Na profecia de Isaías, mais que a imagem do campo, temos a imagem da chuva, que prepara e dá condições para a semeadura. Esse elemento aproxima-se da parábola da semeadura mateana pela referência à Palavra, que no Evangelho é indicada como “a Palavra do Reino” (v. 19).

3. II leitura (Rm 8,18-23)

A segunda leitura, tirada da carta ao Romanos, usa a imagem do “trabalho de parto” para referir-se ao tempo de expectativa da revelação dos filhos de Deus, a qual trará a toda a criação a libertação da “escravidão da corrupção” e a participação na “liberdade e na glória dos filhos de Deus” (v. 21). Algo totalmente novo está para irromper. E não só os cristãos, aqueles que têm os primeiros frutos do Espírito, mas também toda a criação experimentam a ansiedade própria de quem espera esse novo que está para chegar. O autor da carta entende que os sofrimentos da comunidade são “as dores” que antecedem o momento do nascimento. A imagem é forte porque tem dois elementos opostos: “dor atroz” seguida de “enorme alegria”. O sofrimento não terá nenhuma importância no momento em que “nascerem”, se revelarem, os filhos de Deus. Neles, toda a criação será libertada e restaurada. Do mesmo modo que a semente precisa “morrer”, passar pelo processo de corrupção, para germinar, assim a criação experimenta a sensação de destruição para chegar à libertação.

III. Pistas para reflexão

As leituras da liturgia deste domingo são intrigantes porque cada uma delas traz uma imagem específica ligada às demais pela ideia de “frutificar” ou pelo termo “frutos”. A primeira leitura acentua o aspecto da chuva – que, caindo, não retorna – para representar a Palavra de Deus, que, saindo de sua boca, não volta sem produzir os efeitos por ele pretendidos. Isso, porém, é dito por meio da imagem ampla da chuva que rega o solo para o plantio. Os termos germinar, semente e plantio estão presentes. A imagem é a de um campo pronto para ser semeado.

No Evangelho, os termos predominantes são semear (plantio), semente (Palavra) e “dar frutos”, que ligam a imagem da semeadura com a da primeira leitura, mas o acento agora não está na água da chuva que irriga o solo, e sim no próprio solo, na qualidade deste. Enquanto, na primeira leitura, a chuva representa a Palavra, no Evangelho a Palavra é representada pela semente. Embora o acento esteja no solo, sem a semente (Palavra) não haveria semeadura nem frutos.

Seguindo a linha de raciocínio da primeira leitura e do Evangelho, a segunda leitura indica que a comunidade cristã primitiva se entendeu como aquele solo bom no qual a semente germina e dá cem, sessenta e trinta. Por isso, os sofrimentos do tempo presente não a afetarão, porque ela não é o solo pedregoso que desistiria diante do sofrimento ou da perseguição por causa da Palavra. No entanto, os membros da comunidade cristã são apenas os primeiros frutos num campo vasto a ser ainda cultivado, semeado. A Palavra (semente) ainda deve ser lançada em todos os solos, para que se revelem os filhos de Deus.

Os cristãos – das primeiras comunidades e de hoje – são chamados a se manterem como solo bom, sem permitir que a alegria da acolhida inicial da Palavra do Reino seja perdida ou sufocada, mas produza frutos com base na sua escuta e compreensão. Como uma semente, o Reino, embora silencioso e oculto, está prestes a despontar. Estejamos preparados para ver os frutos da semeadura, a manifestação dos filhos de Deus!

Ir. Rita Maria Gomes

é natural do Ceará, onde fez seus estudos de Filosofia no Instituto Teológico e Pastoral do Ceará (Itep), atual Faculdade Católica de Fortaleza. Possui graduação, mestrado e doutorado em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje), onde lecionou Sagrada Escritura. Atualmente é professora na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). É membro do Instituto Religioso Nova Jerusalém, que tem como carisma o estudo e o ensino da Sagrada Escritura.