Roteiros homiléticos

1º DOMINGO DO ADVENTO – 1º de dezembro

Por Zuleica Aparecida Silvano

“Ficai atentos, porque não sabeis em que dia virá o Senhor” (Mt 24,42)

I. Introdução geral

No primeiro domingo do Advento (Ano A), as leituras nos convidam a depositar toda a nossa confiança e esperança no Senhor. O profeta Isaías anuncia a peregrinação de todas as nações para Sião, a fim de serem conduzidas por Deus pelo caminho da justiça e da paz. O salmista canta a alegria do povo por ir à casa do Senhor, pois somente Ele é capaz de nos conceder a salvação. As outras duas leituras (II leitura e evangelho) mostram-nos a imprevisibilidade da vinda de Jesus e da salvação definitiva. O “quando” está reservado a Deus Pai, a nós é solicitada uma espera vigilante. Por isso, Paulo nos convida a ficar despertos, pois precisamos estar preparados para esse encontro definitivo com o Filho do homem, despojando-nos de tudo que nos afasta de Deus (a idolatria e a injustiça) e sendo verdadeiramente filhos da luz.

II. Comentários dos textos bíblicos

1. I leitura: Is 2,1-5

O profeta Isaías (o Primeiro Isaías) provavelmente atuou entre os anos 731 e 701 a.C. no Reino de Judá. Nesse período, Judá passava por grande crise política, econômica e social (cf. Is 1-39). Essa crise foi gerada pela proliferação da injustiça, pela desonestidade de suas lideranças, pela opressão por meio dos impostos e da exploração do trabalho, pelo culto desvinculado da vida e pelas alianças firmadas com as grandes potências, afastando-se da aliança realizada com o Senhor.

O texto da liturgia é extraído do início do livro do profeta Isaías. O v. 2 insiste sobre a questão do tempo, um tempo favorável no qual todos os povos peregrinarão ao monte Sião – onde foi construído o Templo de Jerusalém –, não para participarem do culto religioso de Israel, mas para serem guiados por Deus pelos caminhos da justiça e conhecerem seus preceitos. Ele será o juiz que, tendo como função estabelecer a paz, transformará as armas de guerra em instrumentos para cultivar a terra e torná-la fecunda, plena de vida. Ele transformará as relações entre os povos e fará prevalecer a justiça, a paz, o desarmamento, o bem-estar de todos, a vida digna para todos.

2. II leitura: Rm 13,11-14a

O texto de Romanos está inserido nas exortações descritas nos capítulos 12 e 13 e tem como finalidade explicitar a motivação cristã da obediência. Desse modo, Paulo ressalta a seriedade do tempo que o cristão e a cristã experimentam, pois é o tempo favorável, anunciado pelos profetas. De fato, a salvação anunciada tornou-se realidade na adesão a Jesus por meio da fé e do batismo, ao qual o apóstolo se refere ao falar de “revestir-se de Cristo” (v. 14a). Assim, todo agir cristão deve ser perpassado por essa experiência batismal, pela experiência de seguimento de Jesus Cristo e pela decisão de se deixar guiar pelo Espírito.

Paulo convida os cristãos a despertar, tendo como motivação a proximidade da salvação. Assim, o apóstolo indica a necessidade de ler o presente à luz da experiência batismal e de assumir nova vivência ética (“vistamos as armas da luz”, v. 12). As ações ligadas às trevas são aquelas presentes nos cultos considerados idolátricos (bebedeiras, orgias sexuais), mas também a prática da injustiça (imoralidades, brigas e rivalidades). Por conseguinte, o cristão é chamado a cumprir aquilo que é anunciado no texto de Is 2,1-5: transformar as armas de guerra em armas de luz, o que significa humanizar as relações em todos os níveis.

3. Evangelho: Mt 24,37-44

O texto do evangelho é um trecho do chamado discurso escatológico. Os discursos escatológicos presentes em Mt 24-25 tratam de dois temas: 1) a destruição do Templo e de Jerusalém; 2) a vinda do Filho do homem e a necessária vigilância, pois desconhecemos quando esse evento irá acontecer. A linguagem apocalíptica, presente no texto, é utilizada em contextos difíceis, como é o do Evangelho segundo Mateus, escrito por volta do ano 85 d.C., após a Guerra Judaica e a destruição de Jerusalém e do Templo, sendo um tempo marcado por conflitos entre os judeus e os seguidores de Jesus Cristo.

A passagem escolhida para a liturgia inicia-se mencionando a imprevisibilidade da vinda do Filho do homem, ao compará-la com a situação no tempo de Noé, dado que ninguém esperava pelo dilúvio, somente o patriarca justo (cf. Gn 6,9; 7,1). Por ser uma vinda imprevisível, o evangelista ressalta a importância da vigilância, pois não sabemos quando será o dia ou a hora. Essa data está nas mãos do Pai, porém temos a certeza de que o “Filho do homem” virá.

As imagens do dono da casa e do ladrão (cf. vv. 43-44) reforçam o tema da vigilância e da imprevisibilidade. Assim, a comunidade cristã é chamada a estar sempre atenta e pronta para acolher esse momento definitivo. Provavelmente, a intenção desses discursos é ajudar as comunidades cristãs a avaliar a realidade de conflitos que está vivendo, a animá-las para não desistirem do projeto de Deus e continuarem testemunhando a opção pelo Reino dos Céus. Portanto, mira-se o objetivo de sustentar a esperança cristã, alimentar a fé na vinda definitiva do “Filho do homem” e reforçar a necessidade de constante discernimento e conversão, tendo sempre presente, mesmo nas atividades cotidianas, o compromisso com a construção do Reinado de Deus.

III. Pistas para reflexão

A Federação Bíblica Católica Internacional (Febic) nos convida a celebrar o Ano da Palavra de Deus, com início neste primeiro domingo do Advento e com término no dia 30 de setembro de 2020, tendo como motivação a comemoração do aniversário de morte de São Jerônimo (1.600 anos). Jerônimo foi o tradutor dos textos bíblicos em grego, aramaico e hebraico para o latim, trabalho que deu origem à chamada Vulgata. O cardeal Luis Antonio G. Tagle, responsável pela Febic, ao repetir as palavras do papa Francisco, diz: “Esperamos que, nesse ano dedicado à Palavra de Deus, possamos renovar nossos esforços em torno da Palavra de Deus, centro da vida e da missão da Igreja (EG 174)”. Portanto, que possamos promover iniciativas para que a Sagrada Escritura seja a fonte da evangelização e possa ser ouvida, vivida, celebrada e testemunhada.

Ao iniciar novo ano litúrgico, somos convocados para a vigilância. Diante das leituras, podemos nos perguntar: qual é nossa peregrinação? Qual desejo nos faz mover? Somos movidos para qual meta? Verdadeiramente procuramos trilhar os caminhos do Senhor? O que produz trevas ou luz em nossa vida? Quais sombras nos impedem de caminhar e quais luzes nos guiam? Na comunidade, na família, nas atividades cotidianas, somos testemunhas da luz, que é o próprio Cristo? Quais atividades nossa comunidade assumirá para celebrar o Ano da Palavra de Deus e a celebração de aniversário de morte de São Jerônimo?

Zuleica Aparecida Silvano

Ir. Zuleica Aparecida Silvano, religiosa paulina, licenciada em Filosofia pela UFRGS, mestra em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico (Roma) e doutora em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje), onde atualmente leciona. É assessora no Serviço de Animação Bíblica (SAB/Paulinas) em Belo Horizonte.