Roteiros homiléticos

Publicado em janeiro-fevereiro de 2023 - ano 64 - número 349 - pág.: 48-50

22 de janeiro – 3º DOMINGO DO TEMPO COMUM

Por Ivonil Parraz*

Discipulado: esforço contínuo para conformar-se a Jesus de Nazaré

I. INTRODUÇÃO GERAL

Seguimento ou discipulado é o fio condutor que perpassa as três leituras de hoje. Na primeira leitura, o profeta Isaías anuncia o surgimento da luz que vai trazer alegria a todos os povos que jazem na sombra da morte. Na segunda, Paulo exorta a comunidade de Corinto a viver a unidade, e não a discórdia. Somente Jesus Cristo é o centro de unidade da comunidade. Sem a centralidade em Cristo, a comunidade cai no erro de formar “igrejinhas” em seu interior e seguir o pensamento de alguns de seus líderes. No Evangelho, Jesus convida todos à conversão. Conversão exige fé! Fé, por sua vez, consiste em seguimento. Tal como Simão, André, Tiago e João, somos chamados a deixar tudo para seguir Jesus.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. Evangelho (Mt 4,12-23)

O Evangelho deste domingo nos convida a três atitudes fundamentais: a) ouvir atentamente a mensagem de Jesus. Ele tem sempre um convite para cada um de nós. Seu convite incide sobre nossa vida; b) mudar de vida. A proposta radical de Jesus consiste em abandonar o que em nós há de velho e abraçar o novo. O novo refere-se ao sentido profundo da vida. Encontramos este quando Jesus é a opção fundamental da nossa vida ou o eixo da nossa existência; c) seguir Jesus. O seguimento de Jesus implica fé em sua mensagem e atitude de conversão. Ser cristão é seguir Jesus. Portanto, pertencer a Cristo redunda em conformarmos nossa vida à sua maneira de viver.

  1. a) A mensagem de Jesus

Herodes faz calar João Batista. Jesus faz sua voz ser ouvida por todos os povos! Deixa Nazaré e vai morar em Cafarnaum, às margens do lago da Galileia. Não é gratuita sua escolha. Considerava-se a região da Galileia como lugar dos pagãos: “Galileia dos pagãos” (v. 15). Cafarnaum abria-se para o mar. A ela recorriam povos de várias regiões pagãs. Assim, a opção de Jesus de morar nessa cidade indica que sua Boa Notícia será proclamada a todos os povos: judeus e pagãos. Mas não só: por estar localizado na Galileia o mar de Genesaré (ou Galileia), a região apresentava-se muito fértil, e isso sugere vida nova. A todos os povos anuncia-se vida nova. “O povo que vivia nas trevas viu uma grande luz, e para os que viviam na região escura da morte brilhou uma grande luz” (v. 16). E o que Jesus anuncia? “Convertei-vos, pois o Reino de Deus está próximo” (v. 17).

A mensagem de Jesus apresenta-se bastante simples: Deus se interessa pelas pessoas! O Pai não fica alheio aos seus sofrimentos, independentemente de estarem vinculadas a uma religião ou serem pagãs. Deus está “sempre em saída”! Quer o melhor para todos. Pede a participação do ser humano para levar a vida em plenitude: que “todos tenham vida plena”. Só assim o Reinado de Deus pode acontecer em nosso meio. Ele está próximo, por isso Jesus nos convida a mudar de vida!

  1. b) Mudança de vida

O que é preciso mudar em nós para que o Reino de Deus aconteça? Trata-se de praticar a Boa Notícia de Jesus, ou seja, de introduzir em nosso meio uma maneira de ser revolucionária, para inverter a lógica do mundo:  “que os últimos sejam os primeiros”, “libertar os cativos”. Para isso, o princípio que deve nos mover nessa atuação é o mesmo que moveu Jesus: a compaixão!

Somente quando nos colocamos no lugar do outro, quando decidimos sentir a dor do outro, ocorre em nós a conversão. Não há verdadeira mudança se não estamos dispostos a nos colocar em saída, tal como nosso Pai!

  1. c) Seguir Jesus

Andando na praia, Jesus viu Simão, André, Tiago e João, que estavam lançando as redes, e os convidou para segui-lo (v. 19). Deles Jesus fará “pescadores de homens”. Ora, a fé consiste em seguir Jesus, o que, por sua vez, exige confiança. Somente quando tivermos inteira confiança em alguém poderemos “deixar tudo para segui-lo”. A fé, portanto, leva-nos a fazer uma opção radical: deixar tudo, ou seja, mudar de vida!

Fé e conversão caminham juntas. Por isso, pertencer a Cristo (ser cristão) consiste em esforçar-se continuamente para ir se conformando a Jesus Cristo. Construir a vida segundo o modelo de Jesus Cristo.

À medida que vamos assimilando o modo de vida de Jesus, fazendo dele o eixo de nossa existência, transformamo-nos em “pescadores de homens”, o que significa conduzir o ser humano à presença de Deus para que somente ele reine.

2. I leitura (Is 8,23b-9,3)

Nos tempos passados, Israel (Judá) foi infiel ao seu único Senhor. Tanto na política quanto na religião, Israel confiou no poder dos homens, e não em seu Deus. Por isso, na visão do profeta, caiu sob o domínio de povos estrangeiros. Essa infidelidade resulta na quebra da aliança entre Deus e seu povo eleito.

Todavia, o Deus de Israel nunca desiste de seu povo! Ele restabelece a aliança rompida. A aliança definitiva será a vinda do Messias. Ele será a luz de todos os povos, e não somente de Israel.

Sua presença devolverá a vida a todos aqueles que se encontram na “sombra da morte”. Nele, todos encontrarão o sentido da vida!

3. II leitura (1Cor 1,10-13.17)

Paulo exorta a comunidade de Corinto a ser concorde e, com isso, evitar divisões entre seus membros. Essa exortação decorre do fato de haver nessa comunidade “igrejinhas” particulares, a ponto de alguns dizerem ser do grupo “de Apolo”, “de Paulo”, “de Simão”, “de Cristo” (v. 12). Ora, a identidade que eles julgam ter com este ou aquele grupo exprime uma consciência de Igreja destoante da visão paulina, segundo a qual Cristo é a cabeça e nós, seus membros. Mas não só: exprime também que, para eles, ser cristão depende do pensamento de Paulo, Apolo, Simão...

A exortação de Paulo tem um sentido preciso. A lógica que forma as “igrejinhas” deve ser extirpada da comunidade. Esta deixa de ser “comum-unidade” quando Cristo não é seu centro, o que fica claramente manifesto na existência de grupos em seu interior. Somente a pessoa de Cristo define a comunidade. Ele é o evento fundador da Igreja, seu centro e seu único princípio de unidade: “Cristo foi crucificado por amor de nós” (v. 13).

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

A quem seguimos nesta vida? Essa questão deve estar sempre presente em nosso coração, uma vez que a fé consiste em seguir Jesus. Se de fato queremos ser seguidores de Jesus Cristo, cabe-nos prestar ouvidos à sua mensagem, abraçar sua causa, aderir somente a ele. Nossa comunidade está centralizada em Cristo? Sua adesão a Cristo é total, ou seus membros não vivem na concórdia?

Ivonil Parraz*

*presbítero da diocese de Botucatu, pároco da igreja Santo Antônio de Pádua, Botucatu-SP. Diretor de estudo do Seminário Arquidiocesano São José de Botucatu-SP. Coordenador de pastoral da Região Pastoral 1 da arquidiocese de Botucatu. Mestre e doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP); graduado em Teologia pela Faje, em Belo Horizonte-MG. E-mail: [email protected]