Roteiros homiléticos

Publicado em novembro-dezembro de 2024 - ano 65 - número 360 - pp. 58-60

24 de dezembro – NATAL DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO

Por Pe. Maicon André Malacarne*

Natal: manifestou-se a graça de Deus!

I. Introdução geral

O autor da carta a Tito exulta: “manifestou-se a graça de Deus”. A noite de Natal encontra seu ápice na Boa Notícia do anjo aos pastores: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo Senhor”. O nascimento do Filho de Deus foi preanunciado, como esperança futura, pelo profeta Isaías, em meio a uma situação terrível: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz”.

Celebrar o Natal é acolher o Menino de Belém e exultar com toda a multidão celeste: “Glória a Deus no mais alto dos céus, e paz na terra aos homens por ele amados”. A escuridão desta noite é atravessada por um raio de luz que silencia a potência avassaladora das trevas. O Natal é a festa da luz! O Natal é a certeza da vinda do Senhor na história e no tempo!

II. Comentário dos Textos Bíblicos

1. I leitura (Is 9,1-6)

O profeta Isaías entoa um cântico de alegria pela fidelidade de Deus, que se revela como luz na escuridão do mundo. Deixar-se inundar por essa luz significa alcançar a verdadeira alegria. O cenário de guerra e catástrofe é vencido pela luz de um novo tempo de paz: “tudo será queimado e devorado pelas chamas” (v. 4).

Não foi uma visão do profeta, mas sim sua esperança na fidelidade das promessas de Deus, que nunca esqueceu seu povo. Isaías anunciou o nascimento de um menino: “foi-nos dado um filho; ele traz aos ombros a marca da realeza; o nome que lhe foi dado é: Conselheiro admirável, Deus forte, Pai dos tempos futuros, Príncipe da paz” (v. 5). Embora todos os títulos sejam bastante conhecidos pelo povo como atribuições de um rei, o Menino que nasceu mais de setecentos anos depois foi o próprio Filho de Deus, o Rei do amor e do serviço.

Por longos anos, o povo esperou o nascimento desse Menino, também confundiu sua chegada com o anúncio de tantos reis que foram bons para o povo. Nada se aproxima do significado do nascimento do menino Jesus! No tempo certo, Deus realizou seu projeto de salvação.

2. II leitura (Tt 2,11-14)

Tito era um dos colaboradores mais próximos de Paulo na missão. Alguns autores se referem ao texto dessa carta como um pequeno manual de catequese, cujo ponto de partida é a graça de Deus manifestada em Jesus e o ponto de chegada é sua Páscoa, sua entrega total: “para nos resgatar de toda maldade e purificar para si um povo que lhe pertença e que se dedique a praticar o bem” (v. 14).

Participar da salvação doada por Jesus Cristo significa a responsabilidade de “fazer o bem” mediante uma vida de “equilíbrio, justiça e piedade” (v. 12). O texto de Tito apresenta a conexão profunda entre o Natal e a Páscoa; nascimento, morte e ressurreição fazem parte da grande manifestação do Pai, a qual assumiu em tudo a carne humana e continua a apontar a dimensão pascal de toda vida.

3. Evangelho (Lc 2,1-14)

Todos os anúncios de esperança da tradição dos profetas encontram sentido no nascimento de Jesus, chamado pelo anjo de “Salvador, que é o Cristo Senhor” (v. 11). No título, encontramos o cumprimento da esperança profética e o destino pascal daquele que, pela cruz, salvou o mundo e se tornou Senhor da vida.

O trecho do Evangelho desta noite apresenta, na primeira parte (v. 1-5), a ida de Maria e José para o recenseamento em Jerusalém, exigido pelo decreto de César Augusto. Cumprem a exigência como qualquer outra família. Ao registrar esse episódio, Lucas marca o nascimento de Jesus na história e no tempo; ou seja, Jesus não é fruto da imaginação ou de ideias, mas a vida do Filho de Deus tem as marcas do seu contexto.

Na sequência, o nascimento de Jesus é situado em um local específico, Belém. Sem encontrarem lugar na hospedaria, Maria “deu à luz o seu filho primogênito. Ela o enfaixou e o colocou na manjedoura” (v. 4). Essa simplicidade vai marcar toda a vida do Filho de Deus com uma opção muito preferencial pelos humildes e pobres.

O biblista José Antônio Pagola destaca:

O evangelista narra o nascimento do Messias com uma sobriedade surpreendente. Para Maria “chegou o momento do parto e ela deu à luz seu filho”. Nenhuma palavra a mais. O que realmente parece interessante é a maneira como o menino é acolhido. Enquanto em Belém “não há lugar” nem sequer na hospedaria, em Maria ele encontra uma acolhida comovente. A mãe não tem meios materiais, mas tem coração: “envolveu-o em faixas e deitou-o numa manjedoura” (O caminho aberto por Jesus – Lucas, 2012, p. 39).

Os pastores foram os primeiros que receberam o anúncio desse nascimento. Esse detalhe é importante, porque reforça a “forma” pela qual Deus escolheu vir ao mundo, a partir dos últimos e por meio dos últimos. Os pastores eram considerados pessoas impuras, próximas aos animais, sem inteligência e desonestas. A Boa Notícia de Jesus Cristo se tornou Boa Notícia para todas as pessoas, sem ninguém ficar de fora.

III. Pistas para reflexão

Esta santa noite é momento oportuno de acolher o Senhor na vida e na história. O tempo do Advento e o convite à vigilância, à atenção e à reconciliação encontram sentido no nascimento de Jesus Cristo, o Filho de Deus.  Acolhê-lo significa permitir que sua vida produza mais vida em nós; significa dilatar os espaços do coração para “fazer o bem” e ser um facho de luz em um tempo de tanta escuridão.

O cardeal John Henry Newman partilhou uma oração que pode ser grande farol para concluir nossa reflexão: “Guia-me, ó gentil Luz, / através da escuridão que me cerca, / sê tu que me conduzes! / A noite é escura / e estou longe de casa, / sê tu que me conduzes! / Sustenta meus pés vacilantes: / não peço para ver / o que me espera no horizonte, / um único passo será suficiente”.

Pe. Maicon André Malacarne*

*é pároco da paróquia São Cristóvão, Erechim, diocese de Erexim-RS. Possui mestrado em Teologia Moral pela Pontifícia Academia Alfonsiana (Roma), onde cursa o doutorado. É especialista em Juventude no Mundo Contemporâneo pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje, Belo Horizonte-MG); formado em Filosofia pelo Instituto de Filosofia Berthier (Ifibe, Passo Fundo-RS) e em Teologia pela Itepa Faculdades (Passo Fundo-RS). E-mail: [email protected]