Roteiros homiléticos

Domingo da Páscoa – 12 de abril

Por Luiz Alexandre Solano Rossi

A Páscoa como o novo êxodo

I. Introdução geral

A festa da Páscoa representa o centro de nossa fé. Muitos líderes religiosos viveram e morreram, mas somente o túmulo de Jesus se encontra vazio. Na libertação de Jesus, somos todos libertados. A morte, que era poderosa, tornou-se frágil. A maior e mais terrível força já existente, que ameaçava a integridade e a dignidade do ser humano, foi vencida, de uma vez por todas, pela ressurreição de Jesus.

II. Comentários aos textos bíblicos

1. I leitura: At 10,34a.37-43

Na primeira leitura, encontramos o discurso que Pedro pronunciou na casa do centurião Cornélio. Nesse discurso é sublinhada, com insistência, a participação de Deus nos acontecimentos fundadores da Igreja: “Deus ungiu a Jesus com a força do Espírito Santo”; “Deus estava com ele”; “Deus o ressuscitou ao terceiro dia”; “Deus o nomeou como juiz dos vivos e dos mortos” (vv. 38.40.42). O anúncio de Pedro é que o acesso à Igreja, que constitui um caminho de libertação, foi aberto por Deus a todos os homens e mulheres, tendo como única condição a conversão do coração. Estamos diante de incrível dupla conversão. Tanto Pedro quanto Cornélio passam por um processo de transformação. Fronteiras e preconceitos devem ser vencidos, e, para isso, a presença do Espírito Santo é fundamental. O encontro de Pedro com Cornélio será de enorme importância para entendermos como, com base no amor de Cristo, podemos ser mais tolerantes uns para com os outros, apesar de nossas diferenças. Em Jesus já não há razão para pensarmos em impurezas. Não há cidadão de segunda classe e, por conta disso, uma revolução social tem início. Numa sociedade onde os melhores são diferenciados dos piores, os maiores diferenciados dos menores, Jesus demonstra que o humano é muito mais importante do que a possibilidade de dividi-lo em puro ou impuro.

2. II leitura: Cl 3,1-4

A ressurreição de Jesus representa nossa própria ressurreição. Esta traz novo estilo de vida, o qual se define como a busca das coisas do alto. Todavia, não se trata de trocar as coisas da terra pelas do alto e vivermos como se fôssemos alienados. O mundo em que vivemos foi criado por Deus; ele mesmo invadiu a história quando libertou os escravos no Egito e, supremamente, quando o Verbo se fez carne, assumindo a história da humanidade como se fosse sua própria história. Não é o caso, portanto, de desprezar a realidade do mundo em que vivemos, e sim de saber que temos um projeto do alto para este mundo. A valorização da história deve ser refletida na maneira como se vive o projeto de Jesus na realidade. Deus possui uma “densidade” histórica muito perceptível. O Deus “incriado” invade a história humana para libertar todos quantos se encontram escravizados.

3. Evangelho: Jo 20,1-9

A Páscoa cristã representa um novo êxodo. Uma nova passagem, na qual Deus deseja fazer que as pessoas saiam do país da servidão e caminhem em direção à liberdade. Longe das idolatrias que podem impedir o caminhar, deverá prevalecer o mandamento do amor. A libertação pascal acontece a partir do momento em que o discípulo missionário de Jesus sai de sua prisão pessoal e caminha em direção a Deus e aos irmãos e irmãs, a fim de amá-los. A paixão e a morte de Jesus significam que é Deus, e não a força humana, que nos liberta de nossos limites e impossibilidades. A interpretação do mistério pascal através desses óculos nos permite pensar em iniciativas de libertação social, econômica, ideológica e cultural de todos os oprimidos. Os cristãos, ao vivenciarem o programa de libertação presente na Páscoa, passam a colaborar com todos os que recusam o triunfo do ódio. Por ser puro dom de Deus, a ressurreição preserva o ideal da libertação de todas as armadilhas que tentam prejudicar o ser humano. Nesse sentido, é possível e necessário compreender a ressurreição como uma realidade holística, ou seja, uma realidade produzida por Deus, que busca a libertação integral do ser humano.

Uma cena com características curiosas: por correr mais depressa do que Pedro, o “outro discípulo” chegou antes ao sepulcro. Esse discípulo, “que queria ver Jesus”, viu e creu, conforme o evangelista (v. 8). Todo o Evangelho de João concede a esse amigo de Jesus certa preeminência em relação a Simão Pedro. Na manhã da Páscoa, é exatamente ele que tem a esplêndida intuição da fé no Ressuscitado. Uma fé libertadora, que se apresentava também como um presente do Deus vivo. Com a notícia do túmulo vazio, Pedro e o outro discípulo saem em desabalada carreira. Quem ama sai correndo em direção ao amado. Ao chegar ao túmulo e vê-lo vazio, o discípulo sem nome espera a chegada do seu companheiro. Ele não se considera superior a Pedro. É paciente e espera. Podemos muito bem compreender, porém, que somente aquele que mais ama consegue ver coisas que os outros não veem. Através dos olhos desse discípulo, podemos ver que Jesus está vivo.

No primeiro dia da semana, conforme o texto bíblico, surge a nova criação que emerge da morte e ressurreição de Jesus. Foi num domingo que ele nos recriou a partir de sua ressurreição. Muito possivelmente, Maria Madalena representa a comunidade que está sem a perspectiva da fé e, por isso, não consegue assimilar a morte de Jesus. Como poderia ter morrido aquele em quem depositávamos toda a nossa fé? Ao olhar para o túmulo, ela pensava que ali Deus havia atingido seu limite. Um lugar que ficaria permanentemente marcado, no imaginário do povo, como o local do fracasso de Deus. Todavia, ela busca algo para preencher o vazio de seu coração. Anseia por vida, dignidade e amor. A fé sempre exige de nós algo a mais. Todos podemos ver as mesmas coisas, mas somente aquele que olha com fé poderá transcender-se a partir do olhar. O discípulo amado viu exatamente as mesmas coisas vistas por Pedro. Pode-se dizer que a qualidade do olhar fez toda a diferença. Mesmo que tudo possa indicar o contrário, aquele que olha com fé continua a caminhar; vê além dos horizontes e, mesmo que seja inverno, consegue antecipar a primavera.

III. Pistas para reflexão

1) As atitudes de Pedro e Cornélio muitas vezes ressurgem nos comportamentos de cristãos que, não raro, se apresentam como intolerantes e com o desejo de separar as pessoas. Cultivam preconceitos contra tudo o que é diferente do próprio pensamento e imaginação e, por conta disso, em vez de buscarem a aproximação com as pessoas, acabam por promover o afastamento. Como evangelizar nesse caso?

2) Numa sociedade onde os melhores são diferenciados dos piores, os maiores diferenciados dos menores, Jesus demonstra que o ser humano é muito mais importante do que a possibilidade de divisão. Quais seriam as práticas evangélicas que nos levariam a viver unidos, e não desunidos?

Luiz Alexandre Solano Rossi

é doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp) e pós-doutor em História Antiga pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e em Teologia pelo Fuller Theological Seminary (Califórnia, EUA). É professor no programa de Mestrado e Doutorado em Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Publicou diversos livros, a maioria pela PAULUS, entre os quais: A falsa religião e a amizade enganadora: o livro de Jó; Como ler o livro de Jeremias; Como ler o livro de Abdias; Como ler o livro de Joel; Como ler o livro de Zacarias; Como ler o livro das Lamentações; A arte de viver e ser feliz; Deus se revela em gestos de solidariedade; A origem do sofrimento do pobre.