Roteiros homiléticos

Publicado em novembro-dezembro de 2024 - ano 65 - número 360 - pp. 45-47

17 de novembro – 33º DOMINGO DO TEMPO COMUM

Por Pe. Maicon André Malacarne*

A vinda de Jesus é o chamado à esperança!

I. Introdução geral A proximidade da conclusão de mais um ano litúrgico carrega a marca escatológica, ou seja, dos acontecimentos últimos e definitivos da vida. A literatura apocalíptica, com imagens envolvidas em mistério, sugere que nem tudo pode ser lido de maneira superficial, senão com cuidado, discernimento e aprofundamento, para desvelar o sentido mais próximo do real. O chamado à esperança vem marcado, na primeira leitura, pelo primeiro anúncio da ressurreição do Antigo Testamento. O verbo utilizado é “despertar”. Viver desperto significa viver uma vida alerta, vigilante, atenta aos sinais dos tempos, para manter-se fiel no caminho da justiça. O Evangelho utiliza a parábola da figueira para anunciar que, assim como a chegada do verão pode ser percebida pelas folhas verdes, o Filho do Homem “está perto”, já se pode perceber seus sinais. A proximidade da parúsia, da segunda vinda de Cristo, não deve ser motivo de medo nem desespero, mas sim da saudável confiança em que tudo está destinado à vitória de Jesus Cristo, à vitória do bem e do amor! A garantia, segundo o autor da carta aos Hebreus, na segunda leitura, é que o sacrifício de Cristo na cruz, ponto alto do seu sacerdócio, colocou o mal, os inimigos, “debaixo dos seus pés”. II. Comentário dos textos bíblicos 1. I leitura (Dn 12,1-3) O livro de Daniel tem forte acento apocalíptico, ou seja, está carregado de imagens misteriosas: monstros que lutam, sinais dos astros, animais selvagens, intempéries do tempo, cores, números, estilos e vestimentas particulares. Não se trata de ficção, nem mesmo se pode correr o risco de uma leitura literal e fundamentalista. A literatura apocalíptica tem um objetivo bastante direto: comunicar a esperança e a vitória em meio ao sofrimento e ao caos. De fato, as imagens, que parecem confusas, são escolhidas como símbolos para comunicar que as potências do mal não podem prevalecer diante da força do Reino de Deus que está para chegar. O mal está sendo derrotado! É da apocalíptica, desse respiro de esperança, que chega a primeira grande profissão de fé na ressurreição dos mortos: “Muitos dos que dormem no pó da terra despertarão, uns para a vida eterna, outros para o opróbrio eterno” (v. 2). Será Miguel – o defensor – o sinal de uma vida nova para o povo de Israel, oprimido pelo rei Antíoco IV. Os que se mantiverem no caminho da justiça e da fidelidade, em meio à perseguição, serão envolvidos na glória e na luz de Deus. Ao contrário, o destino dos opressores é a destruição eterna. 2. II leitura (Hb 10,11-14.18) A distinção entre o sacerdócio judaico e o sacerdócio de Cristo é o coração da carta aos Hebreus. Em Cristo, o sacerdócio chega à sua plenitude! Os sacrifícios exteriores foram superados pela oferta do sangue de Jesus, que purificou todos os pecados: “De fato, com esta única oferenda, levou à perfeição definitiva os que ele santifica” (v. 14). Se o pecado já foi vencido por Cristo, os cristãos são convidados a viver com esperança, porque a derrota do pecado, que ainda grita no meio da humanidade, já está decretada:  “até que seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés” (v. 13). Esperar em Cristo não é uma atitude passiva, mas de confiança, de quem sabe em quem espera. O bem e o amor serão sempre vitoriosos, não obstante a potência do mal. Com a plenitude da oferta de Cristo na cruz, toda maldade, todo pecado, toda injustiça serão derrotados! 3. Evangelho (Mc 13,24-32) Grande tribulação, sol que escurece, lua que perde o brilho, estrelas que caem são imagens que compõem o cenário do Evangelho. Do meio desse aparente caos, “o Filho do Homem virá com grande poder e glória” (v. 26). Quando lemos um texto bíblico, uma das perguntas que devem acompanhar é: por que aquilo que está escrito foi escrito assim? De fato, as comunidades do Evangelho de Marcos estavam vivendo anos de muita perseguição e sofrimento, assustadas por causa das guerras e das calamidades. É nesse contexto que a linguagem apocalíptica busca transformar a tragédia em esperança. Apesar das desgraças, a “vinda do Filho do Homem” é a grande esperança! Não se trata de uma vinda para condenar, mas para salvar os “eleitos”, aqueles que conseguiram ser fiéis, mesmo na tribulação. Os eleitos de Deus são chamados ao correto discernimento dos sinais dos tempos. Não significa fugir do mundo com uma espiritualidade fluida, mas assumir as contradições do mundo, lugar aonde o Filho do Homem veio e virá, outra vez, para salvar! No meio da história, a esperança não é uma mágica, um jeito disfarçado de viver, mas a maturidade de aprofundar e compreender tudo o que está acontecendo e apontar para a direção de uma esperança que não tem fim! A continuidade do Evangelho apresenta a parábola da figueira como possível resposta à pergunta que antecede o texto deste domingo: “Quando acontecerá tudo isso?” (Mc 13,4) “Aprendei, pois, da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto” (v. 28). Também nosso tempo “está perto”! A proximidade da vinda do Filho do Homem é um convite a despertar, a preparar-nos, a viver bem nossa vida, e não ser profetas do fim do mundo. Interpretar esses sinais é compromisso do seguidor de Jesus Cristo! Charles Péguy é conhecido como o poeta da esperança. Em um dos seus textos mais importantes, O pórtico do mistério da segunda virtude, escreveu: A pequena esperança avança no meio de suas duas irmãs grandes. E não se nota sequer [...]. Ela, a pequenina, é que arrasta tudo. Porque a Fé não vê senão o que é. E ela vê aquilo que será. A Caridade não ama senão aquilo que é. E ela, sim ela, ama aquilo que será [...]. É ela que faz caminhar as outras duas. Que puxa por elas. E que nos faz caminhar a todos! III. Pistas para reflexão Na contramão dos que anunciam um fim iminente, a liturgia da Palavra deste domingo convida à esperança do “está perto”. A proximidade da vinda do Filho do Homem não pode gerar medo, mas deve despertar para uma vida alerta, vigilante, ressuscitada! É preciso viver bem o tempo que temos! O destino do pecado e de todo o mal já está traçado! A literatura apocalíptica, com forte acento escatológico, também é profética para nossos dias, marcados por guerras, violências, injustiças. A comunidade é o lugar privilegiado para gestar e cuidar da esperança, o motor de uma vida totalmente nova.

Pe. Maicon André Malacarne*

*é pároco da paróquia São Cristóvão, Erechim, diocese de Erexim-RS. Possui mestrado em Teologia Moral pela Pontifícia Academia Alfonsiana (Roma), onde cursa o doutorado. É especialista em Juventude no Mundo Contemporâneo pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje, Belo Horizonte-MG); formado em Filosofia pelo Instituto de Filosofia Berthier (Ifibe, Passo Fundo-RS) e em Teologia pela Itepa Faculdades (Passo Fundo-RS). E-mail: [email protected]