Roteiros homiléticos

25º DOMINGO DO TEMPO COMUM – 24 de setembro

Por Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj

“Meus caminhos não são os vossos” (Is 55,8)

  1. Introdução geral

As leituras de hoje exortam-nos a tomar cuidado para não reduzir Deus aos critérios humanos, por melhor que sejam. Deus ultrapassa tudo o que se pode pensar ou dizer sobre ele. Muitas vezes, seus planos se tornam incompreensíveis ao ser humano. Quando isso acontece, resta-nos perseverar na fidelidade sem mudar de caminho, a exemplo de Jesus, que disse: “Pai, afasta de mim este cálice, contudo não se faça a minha vontade, mas sim a tua” (cf. Mt 26,39). 

      II - Comentário aos textos bíblicos

  1. Evangelho (Mt 20,1-16a): “Os últimos serão os primeiros, e os primeiros serão os últimos”

O texto situa-se no “sermão sobre a comunidade”. Jesus continua instruindo seus seguidores sobre como se comportar no mundo.

O reino dos céus é aqui comparado ao proprietário que contratou vários trabalhadores para sua vinha, em horários diferentes. No final, paga todos igualmente, começando pelos últimos, contratados à tardinha, até os primeiros, contratados de manhã.

A maneira como o patrão trata seus operários chama a atenção para a gratuidade com que Deus nos acolhe em seu reino. Não é segundo os critérios humanos que Deus age em favor da humanidade. A estranheza das palavras de Jesus nessa parábola deve chamar a atenção para nossa maneira de julgar a Deus ou de atribuir-lhe atitudes especificamente humanas.

Geralmente o ser humano quer recompensa por suas boas ações. E, quando não se sente recompensado, acha que Deus é injusto, ou não o ama, ou esqueceu-se dele. Costuma-se até dizer: “Por que Deus não atende as minhas preces? Sou tão dedicado, tenho tanta fé!”.

Mas a maneira de Deus agir não se iguala à nossa. Ele é absolutamente livre para agir como quiser. E essa liberdade é pontuada por seu amor incondicional e sua generosidade inestimável. Deus nos ama e deu-nos mais do que ousamos pedir. Deu-nos a vida. Deu-nos a si mesmo no seu Filho. Deu-nos a eternidade ao seu lado.

Por isso, o reino dos céus não se apresenta como recompensa por nossos méritos pessoais. É puro dom de Deus, que nos chama gratuitamente a participar da vida plena. Cabe-nos acolhê-lo como dom ou ficar numa atitude mesquinha de sempre esperar recompensas por méritos prévios. Isso não é cristianismo, não é gratuidade. Isso não é resposta amorosa a Deus.

  1. I leitura (Is 55,6-9): Que o perverso deixe o seu caminho

O texto da primeira leitura é uma oferta de perdão, paz e felicidade aos pecadores. Em primeiro lugar, assegura que as orações e o arrependimento serão acolhidos por Deus: “buscai o Senhor… invocai-o… deixe o mau caminho… converta-se… que o Senhor se compadecerá” (v. 6-7).

Deus não é como o ser humano; seus pensamentos são totalmente diferentes. Ele é infinitamente fiel: não desiste de seus filhos, não cessa de ofertar-lhes sua misericórdia sem limites. Ao contrário, o ser humano desiste de Deus, trilha outros caminhos, bem diferentes daqueles propostos pelo Senhor.

“Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo os seus pensamentos; converta-se ao Senhor… volte-se para o nosso Deus” (v. 7). Em primeiro lugar, arrepender-se é mudar de caminho, de atitudes, é tomar outros tipos de decisões, fazer outras escolhas. Mas não é só isso: há que mudar também os pensamentos, ou seja, transformar-se internamente, mudando de mentalidade em relação ao mundo, às pessoas e às situações; mudar de ideia a respeito de si mesmo, mudar até mesmo as concepções sobre Deus e sobre seus caminhos, porque o Senhor sempre estará muito além do que se pode dizer e pensar a respeito dele.

Converter-se é mudar de mente e voltar aos caminhos do Senhor. Mas voltar a ele não porque houve total compreensão do seu projeto, e sim porque ele é soberano e misericordioso. A vida humana só tem sentido no relacionamento com Deus, e quando seus caminhos são difíceis de entender e trilhar, resta, acima de tudo, perseverar na fidelidade.

  1. II leitura (Fl 1,20c-24.27a): Meu viver é Cristo

Grande exemplo de perseverança, mesmo que os planos de Deus se tornem incompreensíveis, é-nos dado na leitura da epístola aos Filipenses. O cristão vive unicamente para Deus, não em função de recompensas por méritos pessoais. Qualquer que seja a situação, boa ou ruim, deve perseverar no bem e na busca de agradar unicamente a Deus, seguindo em frente sem hesitar.

O cristão não deve desanimar nunca, ainda que, depois de repetidos esforços, se sinta fracassado ou mesmo perseguido, como o apóstolo Paulo. É necessário confiar somente em Deus, pois só ele pode dar eficácia à atividade humana. Mesmo sem entender o que acontece consigo, o cristão deve viver de modo digno do evangelho (v. 27).

      III. Pistas para reflexão

Não considerar a parábola no plano da justiça social, mas respeitar a estranheza das palavras de Jesus, que têm por objetivo nos conscientizar de que o reino de Deus não se baseia em mérito e recompensa, mas é puro dom. O evangelho do próximo domingo – sobre os irmãos chamados pelo pai a trabalhar na vinha –” enseja destacar a importância do itinerário do povo de Deus, comparando-o ao dos trabalhadores das primeiras horas. Os hebreus foram os primeiros a responder “sim” ao apelo do dono da vinha. As demais nações herdaram desse povo as alianças, as promessas, a história e, principalmente, o Messias. Sejamos gratos a Deus e a Israel, nosso irmão mais velho, fatigado pelo dia inteiro de trabalho.

Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj

Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj, é graduada em Filosofia e em Teologia. Cursou mestrado e doutorado em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, FAJE (MG). Atualmente, leciona na pós-graduação em Teologia na Universidade Católica de Pernambuco, UNICAP. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas – teologia apocalíptica (Paulinas). E-mail: [email protected]