Carta do editor

maio-junho de 2015

Temas bíblico-pastorais

Caros leitores e leitoras,

Graça e paz!

O mundo da chamada “pós-modernidade” tende a girar em torno de “celebridades”, de ídolos ocos, de modismos efêmeros, do consumismo. Costumes que afetam também a Igreja e a vida de fé. Diante dessas tendências culturais, é importante ter presente que a verdadeira “celebridade”, a base e centro da nossa fé, é Jesus Cristo. Toda a pastoral e os ministérios, se adequados, conduzem para ele e para o evangelho, assim como para a práxis que deles decorrem, e não para outras coisas ou pessoas. Já o apóstolo Paulo alertava sobre a imaturidade na fé da comunidade de Corinto, ao se deixarem guiar por “instintos egoístas e agirem como qualquer um”, afirmando “eu sou de Paulo” ou “eu sou de Apolo”: “ninguém pode colocar outro alicerce além do que já está posto, que é Jesus Cristo” (1Cor 3,1-15).

O gosto corrente por “celebridades”, por formas apelativas de práticas religiosas, por liturgias com caráter de entretenimento – mesmo que concebidas como um canal de comunicação com as pessoas de hoje –, se ficar apenas nisso, pode incorrer em uma espécie de mundanismo com aparências de religiosidade, sinalizar uma fé imatura e distante do compromisso com o evangelho ou mesmo fomentar uma espécie de consumismo religioso. É preciso ter cuidado para não reproduzir na Igreja o que há de pior na sociedade. Pelo contrário, a fé cristã nos move em direção a uma consciência e modo de ser alternativos. Em vez de tomar modismos como referência, os cristãos procuram ajudar as pessoas a encontrar um referencial mais sólido, que é Cristo e o evangelho.

Em seu artigo a seguir, dom Pedro Brito lembra a conclamação do papa Francisco para que “não deixemos que nos roubem o evangelho” (Evangelii Gaudium, n. 97). E questiona: “Quem está roubando o evangelho de nós? Quem está deixando roubá-lo? Como é que se rouba ou se deixa roubar o evangelho?”, apontando também as indicações do papa: o mundanismo espiritual, o desejo de vanglória, o esquecimento da profecia.

Aparecem traços evidentes desse pragmatismo e do distanciamento do evangelho nas mentalidades religiosas marcadas pela teologia da prosperidade e nos espetáculos religiosos. Aquela se manifesta de maneira mais clara e forte no neopentecostalismo, mas está também presente nas concepções de muitos católicos, mesmo que de maneira mais moderada, bem como nas missas temáticas, que viram show e esquecem o memorial do sacrifício de Cristo, e nas “missas de cura e libertação”, que tendem a uma espécie de curandeirismo populista, podendo levar a esquecer que as curas realizadas por Jesus são sinais da chegada do Reino e de tudo o que ele significa e que libertação tem um sentido muito profundo em toda a história da salvação, como transformação da realidade, e não apenas um significado intimista e individualista. Está certo que a fé e a oração têm uma dimensão sanativa, mas é preciso o cuidado de aprofundar e embasar isso para não se perder na superficialidade e no populismo.

Não se trata de fazer críticas destrutivas às atividades de comunicadores católicos que têm capacidade de interagir com o grande público ou de ministros e cantores que buscam renovação litúrgica, mas de lembrar a necessidade de aprofundamento, de não esquecer o referencial maior que é Cristo e o evangelho; ressaltar que não convém fazer uma espécie de vale-tudo simplesmente para arrebanhar gente; deixar claro que entre os seguidores de Cristo, ao longo da história, há referências bem melhores para os ministérios eclesiásticos que as celebridades do mundo atual. Um público numeroso, mas distante do evangelho, não é decerto motivo de regozijo.