Roteiros homiléticos

22 de junho – 12º DOMINGO DO TEMPO COMUM

Por Da Redação

PROCLAMAR A FÉ SEM MEDO

I. INTRODUÇÃO GERAL

Para ser povo sacerdotal e profético (tema do 11º domingo comum, não celebrado neste ano), a Igreja e seus membros deverão enfrentar a sorte dos profetas. Morrer e ser rejeitado por seus próprios destinatários é uma constante na vida dos profetas. É o que ocorreu a Jeremias, embora tivesse certeza de que, em última instância, Deus estava com ele (I leitura; o salmo tem o mesmo sentido). A Igreja conhecerá abalos e perseguições, mas não deverá ter medo; é preciso confiar em Deus. É um tema preferido de Mateus, que forma a moldura de seu evangelho: “Emanuel, Deus conosco” (1,23); “Estarei convosco até o fim do mundo” (28,20). Quando a Igreja cumprir sua missão profética, não deverá recear os que matam o corpo, pois Deus cuida até de um par de pardais (evangelho). Daí as admoestações de Cristo no Sermão Missionário para não temer os homens (Mt 10). Quem se solidariza com Cristo, Cristo se solidariza com ele.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

1. I leitura (Jr 20,10-13): A força do profeta perseguido

A situação vivida por Jeremias não tem comparação com a dos demais profetas por sua dramaticidade. Foi o profeta que mais intensamente experimentou a rejeição e a perseguição. Foi chamado a profetizar num período particularmente crítico, às vésperas da ruína do reino de Judá, no século VI a.C. Caçado por seus perseguidores, preso, maltratado, sua tarefa consistia em “arrancar e destruir, exterminar e demolir, construir e plantar” (1,10), e isso contra sua própria gente, seus conterrâneos.

Sua mensagem demolidora contra as instituições do tempo provoca-lhe uma série de ameaças, calúnias, processos e perseguição. Ele anuncia “o terror de todos os lados”, que culminaria na deportação e exílio em Babilônia. Seus adversários, já não suportando o refrão, devolvem-lhe a moeda, acusando-o de terrorista, e, aos cochichos, tramam denúncias (v. 10a). Até os amigos do profeta foram subornados e procuram armar-lhe ciladas, para ver se deixa seduzir-se, se cai na armadilha, a fim de se desforrarem dele (v. 10b). Jeremias está com seu espaço vital minado. Não se sabe exatamente em que consistiam essas ciladas. Mas pela confiança que ele deposita em Deus – e pela forma como exprime essa confiança –, podemos captar a ação dos inimigos do profeta: fazem-lhe violência física para eliminá-lo (atentados, emboscadas) e procuram arrastá-lo ao tribunal para, mediante falsas acusações, condená-lo à morte.

De fato, a confiança do profeta perseguido repousa em Javé, que o protege, “como valente guerreiro” (v. 11a), da violência física. Javé é o guarda-costas do profeta. Examinando o justo, sondando-lhe os rins e o coração (v. 12a), Javé desmascara as falsas acusações contra Jeremias. Javé, portanto, é guarda-costas e advogado de defesa do profeta. Isso não quer dizer que o conflito teria sido eliminado; pelo contrário, existe com toda a violência de que é capaz. Porém, o profeta perseguido já vive na certeza da libertação: Deus já salvou! Sua luta não é estéril: Deus é o guarda-costas e o juiz! 

2. Evangelho (Mt 10,26-33): Confiança e fidelidade na perseguição

Jesus enviou seus discípulos para anunciar e implantar o Reino de Deus (cf. evangelho do 11º domingo comum). No evangelho de hoje, ensina-lhes a firmeza profética. Ensina-os a não ter medo daqueles que matam o corpo e a viver a confiança em Deus acima de tudo.

O Evangelho de Mateus nasceu de uma comunidade que já havia experimentado a violência da perseguição por causa de Jesus. Para os primeiros cristãos, a perseguição entrava na lógica do anúncio evangélico: aconteceu assim com Jesus, assim acontecerá com os que lhe forem fiéis. Contudo, os cristãos se perguntavam: Não existe outra forma de viver o evangelho sem passar pela perseguição? Até que ponto o testemunho cristão tem de passar necessariamente pela rejeição, enfrentando a violência? Como se posicionar diante da morte violenta? Onde está Deus nessa situação?

     Essas perguntas estão por trás do capítulo 10 de Mateus – ao qual nosso texto pertence –, que trata da missão da comunidade cristã diante dos conflitos e perseguições por causa do testemunho. Os colaboradores para a justiça do Reino enfrentam as mesmas rejeições enfrentadas pelo Mestre da Justiça.

     A expressão “Não tenham medo” aparece três vezes no texto (vv. 26.28.31). É, portanto, uma espécie de refrão, marcando com força a ideia de que é preciso ter coragem. O v. 28 mostra a quem a comunidade deve temer. Mas temer aí significa obedecer. Sabemos de que medo se trata: é o medo das consequências que a prática de Jesus suscita – hostilidades, perseguições, sentenças sumárias e morte. Esse medo tinha levado alguns da comunidade a buscar uma forma alternativa de testemunho, contornando os conflitos e perseguições, dando à religião um caráter intimista, de sacristia. Jesus garante que não deve ser assim; pelo contrário, “o que está encoberto será descoberto, e o que está escondido será revelado” (v. 26). Em outras palavras, aquelas intuições nascidas da prática de Jesus precisam ser levadas às últimas consequências, sem fugir delas. Essas intuições desmascaram os sistemas encobertos que promovem a morte. A luta pela justiça do Reino esbarra na resistência dos que não querem mudanças sociais. Foi assim com Jesus. Por que não o será com os discípulos dele?

     Declarar-se a favor de Jesus é superar o medo e enfrentar inclusive a morte. O contexto desses versículos recorda os processos contra os cristãos nos tribunais. Para os primeiros cristãos, o martírio era o momento solene em que podiam proclamar, antes de serem executados, qual razão animava sua vida. Por causa dessa razão, perdiam a vida, sem que ninguém os defendesse. Contudo, o contexto desses versículos recorda outro processo, diante de Deus. Aí, os que confessam Jesus o terão por advogado diante do Pai. O cristão que se declara solidário com Jesus e seu projeto já tem Jesus a seu favor, declarando-se solidário com quem o confessa.

     Segundo esses versículos, portanto, podemos entender qual o sentido da morte para o cristão. Ela tem sentido enquanto solidariedade com Jesus e seu projeto. E essa solidariedade é imediatamente envolvida pela solidariedade de Jesus, o vencedor da morte e comunicador da vida. Essa certeza capacita o cristão para o testemunho de Jesus. Resta, contudo, um desafio: aceitar a proposta, com suas consequências, ou rejeitá-la. Ser ou não ser solidário com Jesus. Ser ou não ser cristão!

3. II leitura (Rm 5,12-15): Com Jesus, passamos da morte à vida

No texto de hoje, são Paulo põe em contraste duas figuras, que representam duas opções de vida diferentes, com consequências contrastantes. Essas figuras são Adão e Jesus Cristo. Adão, o homem velho, por meio do qual o pecado entrou no mundo, trazendo como consequência a morte, contrasta com Jesus Cristo, o homem novo, mediante o qual a graça de Deus se torna presente no mundo, trazendo como consequência a vida em plenitude.

A humanidade inteira é solidária de Adão, no sentido de que todos pecam, sem poder se salvar por conta própria. Mais ainda: cada um de nós é Adão.

Jesus, com sua morte e ressurreição, rompeu o círculo fechado do pecado, salvando-nos por sua misericórdia e poder. É solidário conosco por causa de nossa incapacidade de salvar-nos.

O pecado estraga o mundo e a vida, mas a graça de Deus supera tudo isso. A misericórdia de Deus se manifesta no fato de quebrar o círculo vicioso do pecado, que gera sempre novas mortes, para introduzir a humanidade na esfera da graça e da vida. É assim que Paulo sintetiza o projeto de Deus realizado em Cristo Jesus.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

- O tema fundamental deste domingo é o reconhecimento e gratidão pela graça de Deus, manifestada nos profetas e, sobretudo, em Jesus Cristo. Esse reconhecimento nos leva à convicção e à coragem de professar a fé, apesar das ameaças, do escárnio ou do pouco caso que esse testemunho encontre. Em que pesem as dificuldades e perseguições, sabemos que Deus está conosco.

- Testemunhar Cristo significa testemunhar a Justiça. Na sociedade atual significa ser contra os que fazem do lucro e do poder seus ídolos; significa não ceder a esses ídolos. Pelo reconhecimento da graça de Deus e por sua profissão de fé, o cristão se empenha para que a graça se encarne no mundo e supere as estruturas de pecado que promovem injustiças e desgraças e trazem sofrimento para a humanidade.

Da Redação